... e um bom, muito bom, ano novo
Para o final deste ano de 2004, deixo-vos com a alegria pessimista do best-seller de Kavafis, o poema Ítaca, com tradução da minha autoria e livre do original em grego moderno. Para sairmos em beleza. Pode ser que assim lá cheguemos.
Ítaca
Quando começares a tua viagem para Ítaca
anseia por que o caminho seja longo,
cheio de aventuras, cheio de conhecimento.
Dos Lestrígones e dos Ciclopes,
do irado Posídon não tenhas medo,
nunca encontrarás coisas dessas no teu caminho,
se o teu pensamento se mantiver elevado, se um distinto
sentimento o teu espírito e o teu corpo tocar.
Os Lestrígones e os Ciclopes,
o feroz Posídon não encontrarás,
se não os carregares na tua alma,
se a tua alma não tos apresentar.
Anseia por que o caminho seja longo.
Que sejam muitas as manhãs de Verão
que com tal satisfação, com tal alegria,
entrarás em portos pela primeira vez;
pára em mercados fenícios,
para adquirires as boas mercadorias,
madrepérolas e corais, âmbares e ébanos,
e perfumes inebriantes de todos os tipos,
a maior quantidade de perfumes inebriantes;
visita muitas cidades do Egipto,
para aprenderes e aprenderes dos sábios.
Mantém Ítaca sempre no teu pensamento.
A chegada aí é o teu propósito.
Mas não apresses de maneira nenhuma a viagem.
Melhor que dure muitos anos;
e que chegues velho à ilha,
rico com tudo o que ganhaste no caminho,
não esperando que Ítaca te dê riqueza.
Ítaca deu-te a bela viagem.
Sem ela nunca terias começado.
Mas não tem mais nada para te dar.
E se a encontrares pobre, Ítaca não te enganou.
Assim que te tornaste sábio, com tanta experiência,
terás já percebido o que as Ítacas significam.
Konstandinos Kavafis, 1910
Tradução de Carla Hilário Quevedo
blogue de carla hilário de almeida quevedo bombainteligente@gmail.com
quinta-feira, dezembro 30, 2004
"Nada é mais triste do que ver o ódio sobrepor-se à necessidade": a ler, com urgência, este texto e também este, do Nuno Guerreiro, no Rua da Judiaria.
Eu hoje acordei assim...
Raquel Welch
... embora avisada pela querida Ana do frio de rachar e de ser melhor acordar agasalhada. Coisas que não percebo...
Raquel Welch
... embora avisada pela querida Ana do frio de rachar e de ser melhor acordar agasalhada. Coisas que não percebo...
quarta-feira, dezembro 29, 2004
Move along, there's nothing to see here: para o Fora do Mundo, que depois de nos brindar com um poema em húngaro continua a deixar-nos à míngua com um poema em islandês já lá vai uma catrefada de dias.
Bomba de Ouro
Ciência poética
Átimo de pó
(Carlos Rennó-1997)
Entre a célula e o céu
O DNA e Deus
O quark e a Via Láctea
A bactéria e a galáxia
Entre agora e o eon
O ião e o Órion
A lua e o magnetão
Entre a estrela e o electrão
Entre o glóbulo e o globo blue
Eu, um cosmos em mim só
Um átimo de pó
Assim: do yang ao yin
Eu e o nada, nada não
O vasto, vasto vão
Do espaço até ao spin
Do sem-fim além de mim
Ao sem-fim aquém de mim
Den'de mim
de VB, no Conta Natura.
Ciência poética
Átimo de pó
(Carlos Rennó-1997)
Entre a célula e o céu
O DNA e Deus
O quark e a Via Láctea
A bactéria e a galáxia
Entre agora e o eon
O ião e o Órion
A lua e o magnetão
Entre a estrela e o electrão
Entre o glóbulo e o globo blue
Eu, um cosmos em mim só
Um átimo de pó
Assim: do yang ao yin
Eu e o nada, nada não
O vasto, vasto vão
Do espaço até ao spin
Do sem-fim além de mim
Ao sem-fim aquém de mim
Den'de mim
de VB, no Conta Natura.
Eu hoje acordei assim...
Brad Pitt
... a pedido de algumas leitoras que se queixaram da quantidade excessiva de mulheres muito giras neste blogue (é a história da minha vida: mulheres que gostavam que eu fosse homem, ai weird...) e para ver se acalmo este senhor que precisa de um duche frio. Cup of coffee anyone?
Brad Pitt
... a pedido de algumas leitoras que se queixaram da quantidade excessiva de mulheres muito giras neste blogue (é a história da minha vida: mulheres que gostavam que eu fosse homem, ai weird...) e para ver se acalmo este senhor que precisa de um duche frio. Cup of coffee anyone?
terça-feira, dezembro 28, 2004
Era uma ambulância para a rua da Blogosfera, 3, 5.º esq.
Miguel, já devias saber que postar às 4h17 da matina não dá bom resultado. Mas, enfim, todos temos direito aos nossos delírios e esse poderá ser o teu. Eu também (muito sussurrado) não sou parecida com a Marilyn e acordo assim sempre que posso. Já viste o que me obrigaste a fazer? A revelar algo irrevelável! Bom, just in case, os senhores de bata branca já está avisados e não te vão tratar mal. Tens é de estar calminho.
Miguel, já devias saber que postar às 4h17 da matina não dá bom resultado. Mas, enfim, todos temos direito aos nossos delírios e esse poderá ser o teu. Eu também (muito sussurrado) não sou parecida com a Marilyn e acordo assim sempre que posso. Já viste o que me obrigaste a fazer? A revelar algo irrevelável! Bom, just in case, os senhores de bata branca já está avisados e não te vão tratar mal. Tens é de estar calminho.
segunda-feira, dezembro 27, 2004
Resposta ao cantinho da língua: o lado feminino deste blogue faz-me a seguinte pergunta: "(...) se um indivíduo que mata outro é um homicida, um indivíduo que mata peixes é um piscicida?" Após longas horas de reflexão e estudo cheguei às seguintes conclusões:
1) piscicida é um vocábulo foneticamente ordinário e que embora esteja de acordo com a patologia, é passível de ser confundido com outros quinhentos paus;
2) há outra palavra para peixe que me agrada mais: ixthis. Rings any bell? Pois deve ringar, sim senhora: I (Iesous) X (Xristos) TH (Theon) I (Ios) S (Sotir). Todas as letras (o "th" é uma letra em grego) da palavra em grego antigo indicam o nome de Jesus Cristo como filho de Deus. E assim o peixe passou a ser um símbolo (talvez o primeiro) dos Cristãos;
3) icticida é uma palavra muito pesada, interessante, mas sinceramente prefiro psicopata. Pode ser?
Adenda: no Arqueoblogo temos a explicação em grego de ixthis (o que me permitiu corrigir as terminações que aqui não estavam correctas) e outras informações. Obrigada!
1) piscicida é um vocábulo foneticamente ordinário e que embora esteja de acordo com a patologia, é passível de ser confundido com outros quinhentos paus;
2) há outra palavra para peixe que me agrada mais: ixthis. Rings any bell? Pois deve ringar, sim senhora: I (Iesous) X (Xristos) TH (Theon) I (Ios) S (Sotir). Todas as letras (o "th" é uma letra em grego) da palavra em grego antigo indicam o nome de Jesus Cristo como filho de Deus. E assim o peixe passou a ser um símbolo (talvez o primeiro) dos Cristãos;
3) icticida é uma palavra muito pesada, interessante, mas sinceramente prefiro psicopata. Pode ser?
Adenda: no Arqueoblogo temos a explicação em grego de ixthis (o que me permitiu corrigir as terminações que aqui não estavam correctas) e outras informações. Obrigada!
domingo, dezembro 26, 2004
Etimologia hebdomadária (actualizado)
A palavra para hoje é pesadelo. Mesmo sem sabermos nada desta palavrinha, intui-se imediatamente um peso ali algures. Pois é. Trata-se do pensare latino, exactamente o mesmo que depois levará ao nosso "pensar". Afinal de contas, o pesar tanto pode ser o da reflexão como o da balança. Neste caso, fixemo-nos no segundo. O pesadelo, como diz José Pedro Machado, no Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa, vem de pesado, "pois a pessoa que tem pesadelos sente aflições como se tivesse coisas pesadas a calcar-lhe o peito". Mas vejamos o que Jorge Luis Borges diz sobre o pesadelo*: "Em grego a palavra é efialtes: Efialtes é o demónio que inspira o pesadelo." Nas minhas pesquisas não descobri nenhum demónio chamado Efialtes (só o traidor das Termópilas), mas cheguei a ipiálos, que estará na origem de efialtes (by the way, a palavra mantém-se em grego moderno). Ora este ipiálos significa uma febre com tremores (suores), o que me leva à palavra febre em grego moderno: piretós. Muitas coisas aconteceram on the way, mas é muito provável que a evolução seja esta. Mas continuemos a ouvir Borges: "Em latim temos o incubus. O íncubo é o demónio que oprime o adormecido e lhe inspira o pesadelo. Em alemão temos uma palavra curiosíssima: Alp, que viria a significar o elfo e a opressão do elfo, a mesma ideia de um demónio que inspira o pesadelo. (...) Chegamos agora à palavra mais sábia e ambígua, o nome inglês dos pesadelos: the nightmare, que significa para nós 'a égua da noite'. (...) Porém, segundo os etimologistas a raiz é diferente. A raiz seria night mare ou night maere, o demónio da noite." Leiam o texto todo, demónios incluídos.
* Jorge Luis Borges, Obras Completas, "O pesadelo", Lisboa, Editorial Teorema, 1998, vol. III, pp. 228-239.
Adenda: no Avatares de um Desejo está o quadro de Füssli, The Nightmare, de que Borges fala no ensaio a respeito do Alp (elfo) alemão. Brrr... Medo... Obrigada, Bruno!
Segunda adenda: do blogue A Seita de Fénix recebi a seguinte mensagem, que desde já agradeço: "(...) a propósito da etimologia de «pesadelo», diz que nas suas pesquisas não descobriu nenhum demónio chamado Efialtes. Parece-me, no entanto, que talvez seja de recordar que Efialtes é um dos Gigantes vencidos (salvo erro...) por Júpiter. Nos Lusíadas, por exemplo, há uma passagem qualquer sobre as guerras que opuseram os Deuses aos Gigantes. Os Gigantes são seres monstruosos. Não poderia Borges ter buscado aí «o demónio que inspira o pesadelo»? [cada um dos Gigantes haveria, presumo, de ter uma característica distintiva... ? poderia ser por aí?]. Só como curiosidade: há-de ter reparado que no mesmo volume das Obras Completas que citou (v. p. 116), um dos poemas da Rosa Profunda tem, exactamente, o título Efialtes. Sempre me pareceu ambígua esta ideia de «pesadelo» que parece emergir deste poema: porque «pode ser a prisão a crescendo em labirinto», mas pode também «ser um jardim». E é ao pesadelo (a Efialtes, portanto) que Borges se refere no final do poema, quando fala na «insensata rosa»? [outra vez a ambiguidade ? uma rosa insensata...]. Seja como for, parece não haver dúvidas de que Borges vai buscar a ideia de pesadelo exactamente a Efialtes (a um dos Gigantes, portanto): repare que «o pesadelo» cujo «horror não é deste mundo» «vem de outroras de mito e neblina»... (...) Enfim, conhecendo-se Borges não é ilícito supor que, partindo de um ser monstruoso da mitologia clássica, se atreveu a extrapolar para a etimologia o que à etimologia não pertence..."
A palavra para hoje é pesadelo. Mesmo sem sabermos nada desta palavrinha, intui-se imediatamente um peso ali algures. Pois é. Trata-se do pensare latino, exactamente o mesmo que depois levará ao nosso "pensar". Afinal de contas, o pesar tanto pode ser o da reflexão como o da balança. Neste caso, fixemo-nos no segundo. O pesadelo, como diz José Pedro Machado, no Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa, vem de pesado, "pois a pessoa que tem pesadelos sente aflições como se tivesse coisas pesadas a calcar-lhe o peito". Mas vejamos o que Jorge Luis Borges diz sobre o pesadelo*: "Em grego a palavra é efialtes: Efialtes é o demónio que inspira o pesadelo." Nas minhas pesquisas não descobri nenhum demónio chamado Efialtes (só o traidor das Termópilas), mas cheguei a ipiálos, que estará na origem de efialtes (by the way, a palavra mantém-se em grego moderno). Ora este ipiálos significa uma febre com tremores (suores), o que me leva à palavra febre em grego moderno: piretós. Muitas coisas aconteceram on the way, mas é muito provável que a evolução seja esta. Mas continuemos a ouvir Borges: "Em latim temos o incubus. O íncubo é o demónio que oprime o adormecido e lhe inspira o pesadelo. Em alemão temos uma palavra curiosíssima: Alp, que viria a significar o elfo e a opressão do elfo, a mesma ideia de um demónio que inspira o pesadelo. (...) Chegamos agora à palavra mais sábia e ambígua, o nome inglês dos pesadelos: the nightmare, que significa para nós 'a égua da noite'. (...) Porém, segundo os etimologistas a raiz é diferente. A raiz seria night mare ou night maere, o demónio da noite." Leiam o texto todo, demónios incluídos.
* Jorge Luis Borges, Obras Completas, "O pesadelo", Lisboa, Editorial Teorema, 1998, vol. III, pp. 228-239.
Adenda: no Avatares de um Desejo está o quadro de Füssli, The Nightmare, de que Borges fala no ensaio a respeito do Alp (elfo) alemão. Brrr... Medo... Obrigada, Bruno!
Segunda adenda: do blogue A Seita de Fénix recebi a seguinte mensagem, que desde já agradeço: "(...) a propósito da etimologia de «pesadelo», diz que nas suas pesquisas não descobriu nenhum demónio chamado Efialtes. Parece-me, no entanto, que talvez seja de recordar que Efialtes é um dos Gigantes vencidos (salvo erro...) por Júpiter. Nos Lusíadas, por exemplo, há uma passagem qualquer sobre as guerras que opuseram os Deuses aos Gigantes. Os Gigantes são seres monstruosos. Não poderia Borges ter buscado aí «o demónio que inspira o pesadelo»? [cada um dos Gigantes haveria, presumo, de ter uma característica distintiva... ? poderia ser por aí?]. Só como curiosidade: há-de ter reparado que no mesmo volume das Obras Completas que citou (v. p. 116), um dos poemas da Rosa Profunda tem, exactamente, o título Efialtes. Sempre me pareceu ambígua esta ideia de «pesadelo» que parece emergir deste poema: porque «pode ser a prisão a crescendo em labirinto», mas pode também «ser um jardim». E é ao pesadelo (a Efialtes, portanto) que Borges se refere no final do poema, quando fala na «insensata rosa»? [outra vez a ambiguidade ? uma rosa insensata...]. Seja como for, parece não haver dúvidas de que Borges vai buscar a ideia de pesadelo exactamente a Efialtes (a um dos Gigantes, portanto): repare que «o pesadelo» cujo «horror não é deste mundo» «vem de outroras de mito e neblina»... (...) Enfim, conhecendo-se Borges não é ilícito supor que, partindo de um ser monstruoso da mitologia clássica, se atreveu a extrapolar para a etimologia o que à etimologia não pertence..."
sexta-feira, dezembro 24, 2004
quinta-feira, dezembro 23, 2004
Gatinhos e soft porno
23 de Dezembro de 2004. Uma livraria. Uma fila que dá a volta. No fim da fila. Duas miúdas à minha frente. Como é costume não desespero (ver o post sobre o estranho caso em que fiquei fechada no elevador). Penso em coisas piores: "bom, se estivesse no parque de estacionamento das Amoreiras..." e começo a concentrar-me na novela alheia. As raparigas da frente falam sobre o que têm nas mãos: livros sobre gatos, livrinhos pequeninos sobre bicharada vária e doméstica e livrinhos quiduchos com ursinhos na capa. Estranho tanta capa cor-de-rosinha. "Ah, o Luís vai adorar. Ele gosta tanto de gatos e é um querido, não é?" A amiga responde, dócil, suave como uma pomba: "Tão querido... e o Francisco? Achas que vai gostar deste?" (aponta para um livrito pequenito com uns canitos na capa) "Vai adorar. O Francisco é um querido." Começo a enervar-me, mas só o suficiente para me manter acordada. "Mas o Tó, ai o Tó é que é querido. E, tadinho, perdeu a namorada há tão pouco tempo..." Alto, pensei. Temos drama a sério. Ai que horror! E deve ser um rapaz novo, penso, já pronta a chorar em conjunto com as duas adolescentes visivelmente combalidas. "Ele é tão querido e a miúda enganou-o, tadinho. Agora sempre que me vê, fala, fala, fala... É tão querido..." Respiro de alívio e enervo-me um bocadinho mais. A esta altura da conversa estou desperta, mas na fila pouco se avançou. Lá à frente deve estar um daqueles palhaços com 20 livros para embrulhar, penso, ligeiramente a espumar pela boca. "Mas sabes que agora, lá porque o rapaz gosta de mim e quer falar comigo, toda a gente diz que andamos juntos. As pessoas são mesmo..." A amiga indigna-se, mas responde: "Mas ele também fala imenso comigo. Sempre que me vê... Vê-se que está a sofrer, coitado. E é um querido." Noto uma certa tensão entre ambas. Um querido e duas queridas é coisa para estragar um liceu inteiro. A conversa acabou e eu volto à sesta de pé. Chega a vez das raparigas. Chega a minha vez. Presentes embrulhados e metidos nos sacos. À saída, uma multidão de rapazolas à frente de um televisor. Jogos de futebol a esta hora? Não, viam isto. Ah! Deixei-me estar causando algum constrangimento nos adolescentes. Carinhas branquelas e acnosas ruborescidas. Seriam o Francisco, o Luís e o desgraçado do Tó?
23 de Dezembro de 2004. Uma livraria. Uma fila que dá a volta. No fim da fila. Duas miúdas à minha frente. Como é costume não desespero (ver o post sobre o estranho caso em que fiquei fechada no elevador). Penso em coisas piores: "bom, se estivesse no parque de estacionamento das Amoreiras..." e começo a concentrar-me na novela alheia. As raparigas da frente falam sobre o que têm nas mãos: livros sobre gatos, livrinhos pequeninos sobre bicharada vária e doméstica e livrinhos quiduchos com ursinhos na capa. Estranho tanta capa cor-de-rosinha. "Ah, o Luís vai adorar. Ele gosta tanto de gatos e é um querido, não é?" A amiga responde, dócil, suave como uma pomba: "Tão querido... e o Francisco? Achas que vai gostar deste?" (aponta para um livrito pequenito com uns canitos na capa) "Vai adorar. O Francisco é um querido." Começo a enervar-me, mas só o suficiente para me manter acordada. "Mas o Tó, ai o Tó é que é querido. E, tadinho, perdeu a namorada há tão pouco tempo..." Alto, pensei. Temos drama a sério. Ai que horror! E deve ser um rapaz novo, penso, já pronta a chorar em conjunto com as duas adolescentes visivelmente combalidas. "Ele é tão querido e a miúda enganou-o, tadinho. Agora sempre que me vê, fala, fala, fala... É tão querido..." Respiro de alívio e enervo-me um bocadinho mais. A esta altura da conversa estou desperta, mas na fila pouco se avançou. Lá à frente deve estar um daqueles palhaços com 20 livros para embrulhar, penso, ligeiramente a espumar pela boca. "Mas sabes que agora, lá porque o rapaz gosta de mim e quer falar comigo, toda a gente diz que andamos juntos. As pessoas são mesmo..." A amiga indigna-se, mas responde: "Mas ele também fala imenso comigo. Sempre que me vê... Vê-se que está a sofrer, coitado. E é um querido." Noto uma certa tensão entre ambas. Um querido e duas queridas é coisa para estragar um liceu inteiro. A conversa acabou e eu volto à sesta de pé. Chega a vez das raparigas. Chega a minha vez. Presentes embrulhados e metidos nos sacos. À saída, uma multidão de rapazolas à frente de um televisor. Jogos de futebol a esta hora? Não, viam isto. Ah! Deixei-me estar causando algum constrangimento nos adolescentes. Carinhas branquelas e acnosas ruborescidas. Seriam o Francisco, o Luís e o desgraçado do Tó?
Quem plagia sabe perfeitamente o que está a fazer: a ler o interessante texto da Vieira do Mar sobre a questão do plágio , no Controversa Maresia.
Bomba de Ouro: "Aqui já não se resolvem os grandes problemas da Humanidade. Temos mais que fazer", Papoila Procria.
quarta-feira, dezembro 22, 2004
Eu hoje acordei assim... (super-actualizado)
Marilyn Monroe
... cedo, sem um único presente de Natal comprado e abananada, abananada senhores, com a distinta distinção do Paulo Pinto Mascarenhas. Muito obrigada.
Adenda: também o Ivan distingue este modesto blogue (yeah right!), nomeadamente a rubrica "Eu hoje acordei assim...", chamando-lhe "o maior meme (a palavra certa) da blogosfera". Muito bonito! Os meus agradecimentos.
Segunda adenda: o Rodrigo Moita de Deus atribuiu o prémio "Nunca vou conseguir acordar assim" ao bomba inteligente. Mais uma vez obrigada.
Terceira adenda: também o Aviz demonstrou o seu gosto pelo bomba. Muito obrigada!
Quarta adenda: os meus agradecimentos também para o Nuno Guerreiro que inclui o bomba na lista de blogues da sua preferência.
Quinta adenda: obrigada ainda à triciclofeliz pela inclusão do bomba inteligente na lista de blogues da sua preferência.
Marilyn Monroe
... cedo, sem um único presente de Natal comprado e abananada, abananada senhores, com a distinta distinção do Paulo Pinto Mascarenhas. Muito obrigada.
Adenda: também o Ivan distingue este modesto blogue (yeah right!), nomeadamente a rubrica "Eu hoje acordei assim...", chamando-lhe "o maior meme (a palavra certa) da blogosfera". Muito bonito! Os meus agradecimentos.
Segunda adenda: o Rodrigo Moita de Deus atribuiu o prémio "Nunca vou conseguir acordar assim" ao bomba inteligente. Mais uma vez obrigada.
Terceira adenda: também o Aviz demonstrou o seu gosto pelo bomba. Muito obrigada!
Quarta adenda: os meus agradecimentos também para o Nuno Guerreiro que inclui o bomba na lista de blogues da sua preferência.
Quinta adenda: obrigada ainda à triciclofeliz pela inclusão do bomba inteligente na lista de blogues da sua preferência.
terça-feira, dezembro 21, 2004
Eu hoje acordei assim...
Jamie-Lynn Sigler aka Meadow Soprano
...You woke up this morning
Got yourself a gun,
Mama always said you'd be
The Chosen One.
She said: You're one in a million
You've got to burn to shine,
But you were born under a bad sign,
With a blue moon in your eyes.
You woke up this morning
All the love has gone,
Your Papa never told you
About right and wrong.
But you're looking good, baby,
I believe you're feeling fine, (shame about it),
Born under a bad sign
With a blue moon in your eyes.
You woke up this morning
The world turned upside down,
Thing's ain't been the same
Since the Blues walked into town.
But you're one in a million
You've got that shotgun shine.
Born under a bad sign,
With a blue moon in your eyes.
When you woke up this morning everything you had was
gone. By half past ten your head was going ding-dong.
Ringing like a bell from your head down to your toes,
like a voice telling you there was something you should
know. Last night you were flying but today you're so low
- ain't it times like these that make you wonder if
you'll ever know the meaning of things as they appear to
the others; wives, mothers, fathers, sisters and
brothers. Don't you wish you didn't function, wish you
didn't think beyond the next paycheck and the next little
drink' Well you do so make up your mind to go on, 'cos
when you woke up this morning everything you had was gone.
When you woke up this morning,
When you woke up this morning,
When you woke up this morning,
Mama said you'd be the Chosen One.
When you woke up this morning,
When you woke up this morning,
When you woke up this morning,
You got yourself a gun.
Woke Up This Morning, Alabama 3 (cliquem à direita, onde diz Sopranos, para ouvir a música).
Ah, Luís, e que estimulante é fumar charutos durante o dia e desenterrar corpos à noite... Anger management my foot!
Jamie-Lynn Sigler aka Meadow Soprano
...You woke up this morning
Got yourself a gun,
Mama always said you'd be
The Chosen One.
She said: You're one in a million
You've got to burn to shine,
But you were born under a bad sign,
With a blue moon in your eyes.
You woke up this morning
All the love has gone,
Your Papa never told you
About right and wrong.
But you're looking good, baby,
I believe you're feeling fine, (shame about it),
Born under a bad sign
With a blue moon in your eyes.
You woke up this morning
The world turned upside down,
Thing's ain't been the same
Since the Blues walked into town.
But you're one in a million
You've got that shotgun shine.
Born under a bad sign,
With a blue moon in your eyes.
When you woke up this morning everything you had was
gone. By half past ten your head was going ding-dong.
Ringing like a bell from your head down to your toes,
like a voice telling you there was something you should
know. Last night you were flying but today you're so low
- ain't it times like these that make you wonder if
you'll ever know the meaning of things as they appear to
the others; wives, mothers, fathers, sisters and
brothers. Don't you wish you didn't function, wish you
didn't think beyond the next paycheck and the next little
drink' Well you do so make up your mind to go on, 'cos
when you woke up this morning everything you had was gone.
When you woke up this morning,
When you woke up this morning,
When you woke up this morning,
Mama said you'd be the Chosen One.
When you woke up this morning,
When you woke up this morning,
When you woke up this morning,
You got yourself a gun.
Woke Up This Morning, Alabama 3 (cliquem à direita, onde diz Sopranos, para ouvir a música).
Ah, Luís, e que estimulante é fumar charutos durante o dia e desenterrar corpos à noite... Anger management my foot!
domingo, dezembro 19, 2004
Etimologia hebdomadária
A palavra para hoje é auferir. No artigo "O Luxo do Tempo", publicado na revista Espiral do Tempo, Miguel Esteves Cardoso diz o seguinte: "A tendência natural do ser humano contemporâneo é medir o tempo de acordo com o salário que aufere - 'aufere' é um verbo estranho por alguma razão, que diabo! O advogado que ganha 500 euros à hora acha que gastou uma milena a ver uma partida de futebol com os amigos. Que cegueira, meu Deus!" Pois está-se mesmo a ver que auferir tem origem latina. Que o meu cabelo volte a ser preto se aquele "au" não é o "ab" latino e aquele "ferir" não leva directamente ao infinitivo "ferre". Bem me parecia. O prefixo ab indica afastamento, ausência, privação e ferre tem os sentidos de levar ou tirar. Aos verbos que implicam um acto de subtracção são acrescentados os sentidos negativos do prefixo; ou seja, menos com menos dá mais. E assim se conseguem os extraordinários sentidos "ganhar" ou "obter" numa palavra plena de despojamento (ai que me meti num oximoro!). Será talvez por isso que sinistramente se "auferem salários". E muitas saudades!
A palavra para hoje é auferir. No artigo "O Luxo do Tempo", publicado na revista Espiral do Tempo, Miguel Esteves Cardoso diz o seguinte: "A tendência natural do ser humano contemporâneo é medir o tempo de acordo com o salário que aufere - 'aufere' é um verbo estranho por alguma razão, que diabo! O advogado que ganha 500 euros à hora acha que gastou uma milena a ver uma partida de futebol com os amigos. Que cegueira, meu Deus!" Pois está-se mesmo a ver que auferir tem origem latina. Que o meu cabelo volte a ser preto se aquele "au" não é o "ab" latino e aquele "ferir" não leva directamente ao infinitivo "ferre". Bem me parecia. O prefixo ab indica afastamento, ausência, privação e ferre tem os sentidos de levar ou tirar. Aos verbos que implicam um acto de subtracção são acrescentados os sentidos negativos do prefixo; ou seja, menos com menos dá mais. E assim se conseguem os extraordinários sentidos "ganhar" ou "obter" numa palavra plena de despojamento (ai que me meti num oximoro!). Será talvez por isso que sinistramente se "auferem salários". E muitas saudades!
Bombas de Ouro: TPC: as orações gramaticais, da triciclofeliz e Manual básico para sobreviver à Festa de Natal da Empresa, da Rititi.
sábado, dezembro 18, 2004
Fígado de ganso*
Há um único blogue que corre nas veias do bomba inteligente. Trata-se do Homem a Dias. Como é que se põe a família no top de blogues?
(Pronto, Alberto, já me arranjaste sarilhos com o Pereira Coutinho e com os autores dos restantes blogues que acarinhei num magnífico sumário de sete, já para não falar dos que fazem parte da lista, dos que não fazem e ainda daqueles que não existem. Satisfeito?)
*Simplesmente a coisa mais deliciosa que comi na vida.
Há um único blogue que corre nas veias do bomba inteligente. Trata-se do Homem a Dias. Como é que se põe a família no top de blogues?
(Pronto, Alberto, já me arranjaste sarilhos com o Pereira Coutinho e com os autores dos restantes blogues que acarinhei num magnífico sumário de sete, já para não falar dos que fazem parte da lista, dos que não fazem e ainda daqueles que não existem. Satisfeito?)
*Simplesmente a coisa mais deliciosa que comi na vida.
sexta-feira, dezembro 17, 2004
Muito rapidamente...
... gostaria de dizer que os meus blogues preferidos em 2004 são os seguintes:
- A Causa Foi Modificada
- Impensável
- Diotima
- Mood Swing e
- Quid Rides?
Naturalmente, gosto de todos os que leio diariamente, ou seja, dos que constam da minha lista de linques.
Destaco ainda as participações individuais em blogues colectivos de Inês Teotónio Pereira, em O Acidental, e de João Miranda, no Blasfémias. Sigo o que escrevem com atenção e gosto.
Assunto arrumado.
... gostaria de dizer que os meus blogues preferidos em 2004 são os seguintes:
- A Causa Foi Modificada
- Impensável
- Diotima
- Mood Swing e
- Quid Rides?
Naturalmente, gosto de todos os que leio diariamente, ou seja, dos que constam da minha lista de linques.
Destaco ainda as participações individuais em blogues colectivos de Inês Teotónio Pereira, em O Acidental, e de João Miranda, no Blasfémias. Sigo o que escrevem com atenção e gosto.
Assunto arrumado.
quinta-feira, dezembro 16, 2004
Psicossomático: Luís, ainda acordo a meio da noite com suores frios por causa dos pesadelos com o programa sobre humor. Nesses sonhos maus, a psicóloga Isabel qualquer-coisa agarra-me na manga de uma camisola larga (ainda por cima apareço muito mal vestida) e insiste em contar-me piadas sobre gordos: "É só mais uma, vá lá. Temos de nos saber rir de nós próprios". Respondo, desesperada: "Não! Não diga 'ironia fina'! Por favor, tudo menos isso!" Tento soltar-me, mas nunca consigo. Acordo em pânico. E o encontro marcado em Lisboa já começa mal. Nem nisso temos sorte.
Eu hoje acordei assim...
Anita Ekberg
... ah, como gosto dos dias de sol e céu azul bem frios, e dos dias chuvosos, de trovoada intensa, de vento, de grande ventania, de chuvinha miudinha, e dos dias nublados que não são nem deixam de ser, e daqueles bem quentes, em que nem a sombra nos deixa sossegar...
Anita Ekberg
... ah, como gosto dos dias de sol e céu azul bem frios, e dos dias chuvosos, de trovoada intensa, de vento, de grande ventania, de chuvinha miudinha, e dos dias nublados que não são nem deixam de ser, e daqueles bem quentes, em que nem a sombra nos deixa sossegar...
quarta-feira, dezembro 15, 2004
Bomba de Ouro: "O que dizemos, o que escrevemos agarra-se a nós pela única e injusta razão de que não temos alternativa. Em certa medida (ia dizer em todas, mas não quero ofender ninguém) somos o que dizemos e escrevemos. Pouco mais nos é permitido. E é tão pouco, e é tão bom", de major scobie, no Tradução Simultânea.
terça-feira, dezembro 14, 2004
Bomba de Ouro: "A imodéstia está para a arrogância assim como a ética está para a moral: a imodéstia é demasiado pessoal, é coisa demasiado íntima, remexe em profundezas tão profundas de nós que muito pouco têm a ver com as tendas de circo que se montam em redor das atitudes que se convencionou chamar de arrogantes. Por isso, imagino muito facilmente uma infinidade de atitudes arrogantes sem a ponta de um corno de imodéstia a dar-lhes origem. E, sem grande dificuldade, imagino também uma pessoa redondamente modesta a comportar-se arrogantemente", de maradona.
Getafuckinglife: andam por aí umas crianças a falar sobre a vida privada e profissional da vossa criada fardada. O que quererá essa gente que fala de mim e que linca o bomba (ou não) e opina e sei lá mais o quê? Quererá meter-me a língua no ouvido? Pretenderá um sinal em forma de linque, uma mão amiguinha, uma discussão estimulante, uma boa chapadona na caratonha anónima ou uma palmaducha na fralda? Tenham lá paciência, meus queridos. Não sou nada maternal e embora tenha muito jeito para aplicar castigos, sobretudo em público, não me dá gozo nenhum fazer gato sapato de adolescentes borbulhosos. Controlem lá essa sede de atenção e arranjem umas namoradas, ou uns bons filmes para ver. Se isso não for possível, aceitem os doces que as pessoas estranhas vos oferecerem.
segunda-feira, dezembro 13, 2004
Humor mas nem sempre: o mais constrangedor no programa Prós e Contras sobre o humor em Portugal é a necessidade que os participantes (entrevistadora incluída) parecem ter em ter graça. Os mais velhos querem dizer a sua piada, afinal de contas o programa é sobre isso mesmo. E as saudades da censura, essa grande provocadora da verdadeira graça? E o giro que era o Salazar, ganda maluco tão divertido? Ai... Ricardo, és o maior e o resto é conversa.
Adenda: o Luís, sábio, desligou o televisor depois de ver mais um magnífico episódio dos Sopranos. Ao contrário de mim, que à ganância de ver o Ricardinho, acabei por assistir a um filme de terror. Mas voltando ao que interessa: sempre vi a Meadow (e o namorado que estava no sítio errado à hora errada) como a única possível sucessora de Tony. Pode ser que lá para a décima série...
Adenda: o Luís, sábio, desligou o televisor depois de ver mais um magnífico episódio dos Sopranos. Ao contrário de mim, que à ganância de ver o Ricardinho, acabei por assistir a um filme de terror. Mas voltando ao que interessa: sempre vi a Meadow (e o namorado que estava no sítio errado à hora errada) como a única possível sucessora de Tony. Pode ser que lá para a décima série...
Passear pela blogosfera é bom e faz crescer
- No blogue Ardeu a Padaria, o João Pedro fez o favor de pôr um linque para uma receita de perna de borrego à inglesa com molho de hortelã. É incrível que eu esteja a pensar nisto desde manhã cedo, mas a verdade é que estou.
- Primeiro foi o Tulius Detritus, agora é o Ivan (Vasco, ainda um dia me hás-de explicar qual é a diferença) a gostarem da série mais irritante da blogosfera e arredores, chamada "Eu hoje acordei assim". Ainda bem que gostam, meus queridos, mas deixem-me que vos faça um pequeno reparo: a série chama-se "Eu hoje acordei assim", dando assim um tom totalmente diferente à coisa. Mas a melhor série da blogosfera não é da autoria da vossa criada fardada. A série de todas as séries chama-se "Free Michael" e está no Mood Swing, um dos melhores blogues de sempre, lamentavelmente de parca actualização.
- O Miguel, aproveitando o meu elogio da batata, escreveu o elogio do ovo. Estás a brincar? Queres mesmo que leve a sério o do "qual é coisa qual é ela cai no chão fica amarela"? Longe de mim cair na esparrela de insultar essa coisinha frágil e portadora de doenças, alimento de pouquíssima confiança, e assim dar-lhe importância e, se devidamente lincado, milhares de visitas. Num ano e meio de blogosfera já sei o que devo ou não fazer.
- O BilidaQuid está de birra em Bruxelas (será uma redundância?) e a Miss Pearls teve um chilique daqueles femininos felizmente passageiros (outra redundância?). Calma, calma, melhores dias virão. O importante é sair de casa cada vez menos. Ou mesmo nunca.
- No blogue Ardeu a Padaria, o João Pedro fez o favor de pôr um linque para uma receita de perna de borrego à inglesa com molho de hortelã. É incrível que eu esteja a pensar nisto desde manhã cedo, mas a verdade é que estou.
- Primeiro foi o Tulius Detritus, agora é o Ivan (Vasco, ainda um dia me hás-de explicar qual é a diferença) a gostarem da série mais irritante da blogosfera e arredores, chamada "Eu hoje acordei assim". Ainda bem que gostam, meus queridos, mas deixem-me que vos faça um pequeno reparo: a série chama-se "Eu hoje acordei assim", dando assim um tom totalmente diferente à coisa. Mas a melhor série da blogosfera não é da autoria da vossa criada fardada. A série de todas as séries chama-se "Free Michael" e está no Mood Swing, um dos melhores blogues de sempre, lamentavelmente de parca actualização.
- O Miguel, aproveitando o meu elogio da batata, escreveu o elogio do ovo. Estás a brincar? Queres mesmo que leve a sério o do "qual é coisa qual é ela cai no chão fica amarela"? Longe de mim cair na esparrela de insultar essa coisinha frágil e portadora de doenças, alimento de pouquíssima confiança, e assim dar-lhe importância e, se devidamente lincado, milhares de visitas. Num ano e meio de blogosfera já sei o que devo ou não fazer.
- O BilidaQuid está de birra em Bruxelas (será uma redundância?) e a Miss Pearls teve um chilique daqueles femininos felizmente passageiros (outra redundância?). Calma, calma, melhores dias virão. O importante é sair de casa cada vez menos. Ou mesmo nunca.
Só acordamos bem em casa
A ASL hoje acordou com vontade de se chamar Kimberly. K. Com simpatia, teve a delicadeza de me dedicar o segredo que desde já agradeço. Mas o segredo não foi revelado: Kimberly quê, valha-me Santo António? Kimberly Williams? Ou Kimberly Steele? Será Kimberly Basinger? Ou Kimberly Carnes? Não haverá por essa Internet fora um motor de busca que me encontre uma Kimberly à altura que resolva o enigma?
Adenda: pronto, o enigma está resolvido. Mas no horror da pesquisa descobri que a Kim Basinger se chama Kimila Ann Basinger. O conhecimento nem sempre é uma coisa boa.
A ASL hoje acordou com vontade de se chamar Kimberly. K. Com simpatia, teve a delicadeza de me dedicar o segredo que desde já agradeço. Mas o segredo não foi revelado: Kimberly quê, valha-me Santo António? Kimberly Williams? Ou Kimberly Steele? Será Kimberly Basinger? Ou Kimberly Carnes? Não haverá por essa Internet fora um motor de busca que me encontre uma Kimberly à altura que resolva o enigma?
Adenda: pronto, o enigma está resolvido. Mas no horror da pesquisa descobri que a Kim Basinger se chama Kimila Ann Basinger. O conhecimento nem sempre é uma coisa boa.
domingo, dezembro 12, 2004
Etimologia hebdomadária
A palavra para hoje é influência. O particípio presente do verbo latino influere - influens, influentis - estará na origem do vocábulo influência (e muito com certeza de influente, uma vez que é a cara chapadinha em português do dito particípio latino). Ora influere bem dissecado dá in + fluo, ou seja, correr para, lançar-se em; ou mesmo insinuar-se em, espalhar-se em. Ouço um rio a desaguar em influere mas será porque ainda não jantei. A influência será então a acção de alguma coisa sobre outra, quer de maneira ansiosa (correr para), precipitada (lançar-se em) ou inevitável (espalhar-se em), algo que indica uma relação de autoridade: é influente quem ou o que é importante, mesmo que não o percebamos. Sinónimos de influência são, por exemplo, predomínio e crédito e não cópia e decalque. E ainda bem que os antónimos não se anulam, se não, pela simples existência da palavra influência teríamos de abolir vocábulos como originalidade.
Adenda: o Impensado, simpático (no verdadeiro - ou etimológico - sentido da palavra), escreve sobre a "influenza".
A palavra para hoje é influência. O particípio presente do verbo latino influere - influens, influentis - estará na origem do vocábulo influência (e muito com certeza de influente, uma vez que é a cara chapadinha em português do dito particípio latino). Ora influere bem dissecado dá in + fluo, ou seja, correr para, lançar-se em; ou mesmo insinuar-se em, espalhar-se em. Ouço um rio a desaguar em influere mas será porque ainda não jantei. A influência será então a acção de alguma coisa sobre outra, quer de maneira ansiosa (correr para), precipitada (lançar-se em) ou inevitável (espalhar-se em), algo que indica uma relação de autoridade: é influente quem ou o que é importante, mesmo que não o percebamos. Sinónimos de influência são, por exemplo, predomínio e crédito e não cópia e decalque. E ainda bem que os antónimos não se anulam, se não, pela simples existência da palavra influência teríamos de abolir vocábulos como originalidade.
Adenda: o Impensado, simpático (no verdadeiro - ou etimológico - sentido da palavra), escreve sobre a "influenza".
sexta-feira, dezembro 10, 2004
Sempre o mesmo problema com as sobrancelhas
(Via Torneiras de Freud.)
Doctor Unheimlich has diagnosed me with
Bomba inteligenteitis | |
Cause: | eating spicy food |
Symptoms: | vomiting blood, bushy eyebrows, occasional headaches |
Cure: | take four spoons of cod liver oil and come back in the morning |
(Via Torneiras de Freud.)
O conto de Natal que interessa
"24 de Dezembro
O Meridien, o Hilton e o Sheraton estão cheios. Ainda bem, assim poupamos uns sestércios. Eu sei que é um bocado semítico da minha parte, mas é mais forte que eu."
São José - o filofax, Carlos Quevedo e Rui Zink, em Outros Belos Contos de Natal, Ediraia.
"24 de Dezembro
O Meridien, o Hilton e o Sheraton estão cheios. Ainda bem, assim poupamos uns sestércios. Eu sei que é um bocado semítico da minha parte, mas é mais forte que eu."
São José - o filofax, Carlos Quevedo e Rui Zink, em Outros Belos Contos de Natal, Ediraia.
Eros - Nível IX
Estaba ocupado mientras me querías
y pasé de apasionado a ser un ser indiferente,
miraba a otro lado, vos te despedías
y pasé de indiferente a vivir arrepentido.
de Volver, Loción Migré.
Estaba ocupado mientras me querías
y pasé de apasionado a ser un ser indiferente,
miraba a otro lado, vos te despedías
y pasé de indiferente a vivir arrepentido.
de Volver, Loción Migré.
quinta-feira, dezembro 09, 2004
Bomba de Ouro: "A feminilidade, se é um estado a ser alcançado, é notavelmente parecida com a chatice. A masculinidade, vista desse mesmo modo meio místico, meio infantil, é mais aberta à aventura, mais suportável. Ou pelo menos não vive confinada em apartamentinhos onde as pessoas rompem relacionamentos e borram a maquiagem toda enquanto ouvem Elis", de Alexandre Soares Silva.
quarta-feira, dezembro 08, 2004
O Livro do Barnabé
Começo por dizer que não tenho nem simpatia nem antipatia pelo Barnabé. Até agora nunca me aconteceu concordar com algum post ali publicado e isso impede-me de visitar assiduamente o blogue. Tenho, por isso, as condições essenciais para fazer uma crítica absolutamente livre. O livro está muito bem feito, muitíssimo bem editado (tarefa menos fácil do que se pensa, sobretudo quando se fala de textos que correm o risco de depressa se tornarem datados), a paginação é excelente e a capa muito atractiva. A frase na capa "o blogue que a direita detesta" é chamativa e define o teor do livro e do blogue sem definir o público comprador. Parece-me ideal. A divisão em capítulos foi bem pensada e o índice remissivo é muito interessante e útil (sobretudo para leitores a quem só interessa ler alguns excertos). A utilização das imagens e dos linques em cada post, demonstrando assim a que blogues se referem, enriquece os textos que, enfim, são o que são: muito bons para uns, desinteressantes para outros e irritantes para outros ainda. Gosto do livro e pelo blogue não tenho o mínimo interesse. Ainda dizem mal dos blogues que passam para o formato de livro. Cada vez percebo menos porquê. Os meus parabéns!
Começo por dizer que não tenho nem simpatia nem antipatia pelo Barnabé. Até agora nunca me aconteceu concordar com algum post ali publicado e isso impede-me de visitar assiduamente o blogue. Tenho, por isso, as condições essenciais para fazer uma crítica absolutamente livre. O livro está muito bem feito, muitíssimo bem editado (tarefa menos fácil do que se pensa, sobretudo quando se fala de textos que correm o risco de depressa se tornarem datados), a paginação é excelente e a capa muito atractiva. A frase na capa "o blogue que a direita detesta" é chamativa e define o teor do livro e do blogue sem definir o público comprador. Parece-me ideal. A divisão em capítulos foi bem pensada e o índice remissivo é muito interessante e útil (sobretudo para leitores a quem só interessa ler alguns excertos). A utilização das imagens e dos linques em cada post, demonstrando assim a que blogues se referem, enriquece os textos que, enfim, são o que são: muito bons para uns, desinteressantes para outros e irritantes para outros ainda. Gosto do livro e pelo blogue não tenho o mínimo interesse. Ainda dizem mal dos blogues que passam para o formato de livro. Cada vez percebo menos porquê. Os meus parabéns!
terça-feira, dezembro 07, 2004
Pormenores (23)
... desato-me a rir sempre que vejo Usher, no vídeo de Confessions Part II, a sacar de uma pequena escova e a passá-la pelo cabelo e pela barba, enquanto canta e dança, para depois a voltar a colocar no bolso de trás das calças de ganga...
... desato-me a rir sempre que vejo Usher, no vídeo de Confessions Part II, a sacar de uma pequena escova e a passá-la pelo cabelo e pela barba, enquanto canta e dança, para depois a voltar a colocar no bolso de trás das calças de ganga...
segunda-feira, dezembro 06, 2004
ZZzzzzZZZz...: o maradona (com minúscula) voltou à sua antiga casinha. Toca a mudar os linques outra vez! Chato.
sexta-feira, dezembro 03, 2004
quinta-feira, dezembro 02, 2004
Grave, grave, muito grave
Decorre no submundo do submundo da blogosfera (ou seja, no e-mail) uma discussão sobre uma certa e determinada ementa a ser saboreada num certo e determinado dia, a certas horas, em determinado lugar. Ora põe-se agora o problema (a meu ver escandaloso e comprometedor da presença de alguns distintos convidados) de terem sido excluídos o saltitante arroz (preferência do sempre jovem Alberto) e a fiável batata (tubérculo que estimo e que me acompanha quase diariamente... no bolso). Deixo à consideração do Presidente da AAP e dedico ao estimadíssimo adversário (o arroz é para crianças, pá!) umas palavrinhas sobre a Batata, essa Grande Senhora, para que a nossa tão grande amiga não se veja assim ostracizada. Entre o arroz e a batata, venha o Presidente da AAP e escolha a segunda! E já agora...
O Elogio da Batata
Porque tem a batata de ser elogiada? À primeira vista, parece não haver razões para sequer falar sobre ela. Talvez por ser um tubérculo, um ser vivo incapaz de se deslocar, bruto de aspecto e às vezes amargo de sabor. Sabemos que a batata não é um animal, nem uma pessoa nem uma cidade e que, por isso, não se integra em nenhuma das categorias passíveis de serem objecto de encómio. A aparente insignificância da batata afasta-nos de qualquer interesse que tenhamos em pesquisar a sua história. Mas se ultrapassarmos esta barreira, rapidamente chegaremos à conclusão de que as aparências iludem e de que o ser aparentemente mais banal pode afinal aliviar, ou mesmo solucionar, um dos mais problemas mais avassaladores do mundo: a fome.
Julgo que o elogio é a melhor forma de destacar algo que até agora não mereceu destaque. Neste caso, por uma razão: porque ao pesquisarmos as origens e os feitos desta planta, e os comparamos com os de outros tubérculos, compreendemos a sua importância. O elogio da batata é uma forma de exprimirmos a nossa gratidão por esse tubérculo que nos acompanha silencioso diariamente há milhares de anos sem nunca nos dar um motivo de decepção.
A batata (solanum tuberosum) foi cultivada pela primeira vez há dois mil anos nas montanhas do Peru, tendo sido descoberta pelos Espanhóis e levada para a Europa em meados do século XVI. Este facto histórico é importante porque nos permite perceber que a batata não é uma planta nova. A passagem do tempo transformou a batata, mas esta manteve-se fundamental para os povos que a cultivavam. Através da selecção e de processos de cruzamento biológico, inicialmente feitos pelas civilizações incas que a tornaram comestível, a batata passou de tubérculo originalmente amargo, pequeno e multicolor a planta cultivável em qualquer tipo de terreno, ambiente e em quaisquer condições climatéricas. A batata acabou por se adaptar a climas tão diferentes como o dos países do Mediterrâneo ou o dos países do Oriente, dando origem aos cerca de cinco mil tipos de batatas que existem hoje em dia.
A batata é um alimento rico em vitamina C, vitamina B6, fibra, proteína, carbo-hidratos, fósforo, magnésio e ferro. Na pele da batata estão concentrados proteínas, vitaminas e potássio. E, ainda por cima, ao contrário do que nos ensinaram, a batata não engorda. Os molhos que inventaram para torná-la ainda mais saborosa são os verdadeiros responsáveis pelo seu aumento calórico. Mas que alimento é tão versátil na sua feitura e junto com as suas capacidades nutritivas tem um sabor que tem aprovação universal? Pode não se gostar de batata cozida, mas gostar-se de batata frita. Será, no entanto, possível não se gostar de batata cozinhada de maneira nenhuma? Não me façam rir!
Os índios Aimará incrementaram cerca de duzentos tipos de batatas e descobriram um método de secagem, ainda hoje utilizado, que permite o armazenamento das batatas durante quatro anos. Os Incas respeitavam a batata e acreditavam nos seus poderes premonitórios. Também para os Incas, os diferentes tempos de cozedura da batata correspondiam às unidades de tempo real. O culto do tubérculo está patente na cerâmica com forma de batata e pequeninos olhos gravados frequentemente descoberta em escavações de sítios de interesse arqueológico no Peru e na Bolívia.
Será possível, hoje em dia, sequer pensar numa Europa sem batatas? Quando os Espanhóis descobriram a batata em 1537, passaram a dar-lhe importância, não por causa do seu sabor - que apreciavam - mas por verificarem que os marinheiros que a comiam não sofriam de escorbuto. Em 1620, Frederico I da Prússia ordenou que fossem plantadas batatas para resolver o problema da fome, decisão que acabou por salvar muita gente durante a Guerra dos Sete Anos. Parmentier, soldado francês detido em Hamburgo nessa Guerra, acostumou-se à dieta de batata da prisão e quando foi libertado sugeriu a Luís XVI e a Marie Antoinette que o cultivo e consumo do tubérculo seriam benéficos para o país. Para tornar a história mais interessante, Parmentier ordenou aos seus guardas que vigiassem uma grande plantação de batatas nos arredores de Paris. Os camponeses logo trataram de saber que coisa precisava de tanta vigilância. Roubaram as sementes e plantaram-nas nos seus próprios jardins. A partir daí, a popularidade da batata em França nunca mais parou de aumentar. Verificou-se que a batata tinha pernas para andar! Nestas três histórias reais, observamos que o consumo da batata teve consequências na saúde pública e solucionou o problema da fome em tempo de guerra e em período de paz.
A Grande Fome na Irlanda, em 1830, surge como o exemplo máximo da importância da batata, não pela sua implementação (que data de finais do século XVI) mas pela sua ausência. Nas vésperas da Grande Fome, mais de um terço da população irlandesa alimentava-se apenas de batata. Era pouca a variedade de utensílios usada nas cozinhas irlandesas e vasto o número de maneiras de cozinhar o tubérculo. Em 1845, um fungo devastou milhares de plantações de batata por toda a Irlanda, deixando milhões de pessoas numa situação de debilidade extrema. Sem a batata para os alimentar, dois milhões de irlandeses foram obrigados a emigrar e um milhão morreu na Grande Fome. Até hoje, fica por explicar como numa ilha ninguém se lembrou de pescar. Mas esse não é um problema da batata, nem da falta da mesma; é dos Irlandeses.
A grandeza da batata nem com a do arroz se pode comparar. Isto por uma razão muito simples: a batata pode ser cultivada em todos os tipos de terreno, como vimos anteriormente. E é tão resistente que pode mesmo crescer em temperaturas baixíssimas e perto da neve. Daí existirem cinco mil tipos de batata. Com o arroz, nada disso se passa. O arroz precisa de terrenos abundantes em água e de condições climatéricas especiais para se desenvolver. O seu cultivo é, por isso, restrito. O argumento de que existem outros tubérculos - o nabo, a batata-doce, entre outros - não é suficiente para me dissuadir. A verdade é que podemos bem passar sem eles.
Por se poder cultivar em toda a parte do mundo e por apresentar as qualidades nutritivas descritas no início, a batata é um alimento de custos baixos de produção e, consequentemente, de grande consumo. Nos países carenciados, a protecção dos batatais está prevista em directivas estabelecidas pela ONU, para que não volte a acontecer uma tragédia como a de 1845. Hoje em dia, milhões de pessoas dependem da batata, quer como consumidores quer como cultivadores ou exportadores.
O que mais se pode dizer da humilde batata? Nada, a não ser, muito obrigada!
Bibliografia
The Complete Works of Aristotle, the revised Oxford translation, ed. Jonathan Barnes, vol. II, New Jersey, Princeton University Press, 1984, pp. 2152-2269.
The Oxford Companion to Food, Alan Davidson, New York, Oxford University Press, 1999, pp. 406-7, 627-29.
Decorre no submundo do submundo da blogosfera (ou seja, no e-mail) uma discussão sobre uma certa e determinada ementa a ser saboreada num certo e determinado dia, a certas horas, em determinado lugar. Ora põe-se agora o problema (a meu ver escandaloso e comprometedor da presença de alguns distintos convidados) de terem sido excluídos o saltitante arroz (preferência do sempre jovem Alberto) e a fiável batata (tubérculo que estimo e que me acompanha quase diariamente... no bolso). Deixo à consideração do Presidente da AAP e dedico ao estimadíssimo adversário (o arroz é para crianças, pá!) umas palavrinhas sobre a Batata, essa Grande Senhora, para que a nossa tão grande amiga não se veja assim ostracizada. Entre o arroz e a batata, venha o Presidente da AAP e escolha a segunda! E já agora...
O Elogio da Batata
Porque tem a batata de ser elogiada? À primeira vista, parece não haver razões para sequer falar sobre ela. Talvez por ser um tubérculo, um ser vivo incapaz de se deslocar, bruto de aspecto e às vezes amargo de sabor. Sabemos que a batata não é um animal, nem uma pessoa nem uma cidade e que, por isso, não se integra em nenhuma das categorias passíveis de serem objecto de encómio. A aparente insignificância da batata afasta-nos de qualquer interesse que tenhamos em pesquisar a sua história. Mas se ultrapassarmos esta barreira, rapidamente chegaremos à conclusão de que as aparências iludem e de que o ser aparentemente mais banal pode afinal aliviar, ou mesmo solucionar, um dos mais problemas mais avassaladores do mundo: a fome.
Julgo que o elogio é a melhor forma de destacar algo que até agora não mereceu destaque. Neste caso, por uma razão: porque ao pesquisarmos as origens e os feitos desta planta, e os comparamos com os de outros tubérculos, compreendemos a sua importância. O elogio da batata é uma forma de exprimirmos a nossa gratidão por esse tubérculo que nos acompanha silencioso diariamente há milhares de anos sem nunca nos dar um motivo de decepção.
A batata (solanum tuberosum) foi cultivada pela primeira vez há dois mil anos nas montanhas do Peru, tendo sido descoberta pelos Espanhóis e levada para a Europa em meados do século XVI. Este facto histórico é importante porque nos permite perceber que a batata não é uma planta nova. A passagem do tempo transformou a batata, mas esta manteve-se fundamental para os povos que a cultivavam. Através da selecção e de processos de cruzamento biológico, inicialmente feitos pelas civilizações incas que a tornaram comestível, a batata passou de tubérculo originalmente amargo, pequeno e multicolor a planta cultivável em qualquer tipo de terreno, ambiente e em quaisquer condições climatéricas. A batata acabou por se adaptar a climas tão diferentes como o dos países do Mediterrâneo ou o dos países do Oriente, dando origem aos cerca de cinco mil tipos de batatas que existem hoje em dia.
A batata é um alimento rico em vitamina C, vitamina B6, fibra, proteína, carbo-hidratos, fósforo, magnésio e ferro. Na pele da batata estão concentrados proteínas, vitaminas e potássio. E, ainda por cima, ao contrário do que nos ensinaram, a batata não engorda. Os molhos que inventaram para torná-la ainda mais saborosa são os verdadeiros responsáveis pelo seu aumento calórico. Mas que alimento é tão versátil na sua feitura e junto com as suas capacidades nutritivas tem um sabor que tem aprovação universal? Pode não se gostar de batata cozida, mas gostar-se de batata frita. Será, no entanto, possível não se gostar de batata cozinhada de maneira nenhuma? Não me façam rir!
Os índios Aimará incrementaram cerca de duzentos tipos de batatas e descobriram um método de secagem, ainda hoje utilizado, que permite o armazenamento das batatas durante quatro anos. Os Incas respeitavam a batata e acreditavam nos seus poderes premonitórios. Também para os Incas, os diferentes tempos de cozedura da batata correspondiam às unidades de tempo real. O culto do tubérculo está patente na cerâmica com forma de batata e pequeninos olhos gravados frequentemente descoberta em escavações de sítios de interesse arqueológico no Peru e na Bolívia.
Será possível, hoje em dia, sequer pensar numa Europa sem batatas? Quando os Espanhóis descobriram a batata em 1537, passaram a dar-lhe importância, não por causa do seu sabor - que apreciavam - mas por verificarem que os marinheiros que a comiam não sofriam de escorbuto. Em 1620, Frederico I da Prússia ordenou que fossem plantadas batatas para resolver o problema da fome, decisão que acabou por salvar muita gente durante a Guerra dos Sete Anos. Parmentier, soldado francês detido em Hamburgo nessa Guerra, acostumou-se à dieta de batata da prisão e quando foi libertado sugeriu a Luís XVI e a Marie Antoinette que o cultivo e consumo do tubérculo seriam benéficos para o país. Para tornar a história mais interessante, Parmentier ordenou aos seus guardas que vigiassem uma grande plantação de batatas nos arredores de Paris. Os camponeses logo trataram de saber que coisa precisava de tanta vigilância. Roubaram as sementes e plantaram-nas nos seus próprios jardins. A partir daí, a popularidade da batata em França nunca mais parou de aumentar. Verificou-se que a batata tinha pernas para andar! Nestas três histórias reais, observamos que o consumo da batata teve consequências na saúde pública e solucionou o problema da fome em tempo de guerra e em período de paz.
A Grande Fome na Irlanda, em 1830, surge como o exemplo máximo da importância da batata, não pela sua implementação (que data de finais do século XVI) mas pela sua ausência. Nas vésperas da Grande Fome, mais de um terço da população irlandesa alimentava-se apenas de batata. Era pouca a variedade de utensílios usada nas cozinhas irlandesas e vasto o número de maneiras de cozinhar o tubérculo. Em 1845, um fungo devastou milhares de plantações de batata por toda a Irlanda, deixando milhões de pessoas numa situação de debilidade extrema. Sem a batata para os alimentar, dois milhões de irlandeses foram obrigados a emigrar e um milhão morreu na Grande Fome. Até hoje, fica por explicar como numa ilha ninguém se lembrou de pescar. Mas esse não é um problema da batata, nem da falta da mesma; é dos Irlandeses.
A grandeza da batata nem com a do arroz se pode comparar. Isto por uma razão muito simples: a batata pode ser cultivada em todos os tipos de terreno, como vimos anteriormente. E é tão resistente que pode mesmo crescer em temperaturas baixíssimas e perto da neve. Daí existirem cinco mil tipos de batata. Com o arroz, nada disso se passa. O arroz precisa de terrenos abundantes em água e de condições climatéricas especiais para se desenvolver. O seu cultivo é, por isso, restrito. O argumento de que existem outros tubérculos - o nabo, a batata-doce, entre outros - não é suficiente para me dissuadir. A verdade é que podemos bem passar sem eles.
Por se poder cultivar em toda a parte do mundo e por apresentar as qualidades nutritivas descritas no início, a batata é um alimento de custos baixos de produção e, consequentemente, de grande consumo. Nos países carenciados, a protecção dos batatais está prevista em directivas estabelecidas pela ONU, para que não volte a acontecer uma tragédia como a de 1845. Hoje em dia, milhões de pessoas dependem da batata, quer como consumidores quer como cultivadores ou exportadores.
O que mais se pode dizer da humilde batata? Nada, a não ser, muito obrigada!
Bibliografia
The Complete Works of Aristotle, the revised Oxford translation, ed. Jonathan Barnes, vol. II, New Jersey, Princeton University Press, 1984, pp. 2152-2269.
The Oxford Companion to Food, Alan Davidson, New York, Oxford University Press, 1999, pp. 406-7, 627-29.
Calma, gente blogueira!
A nova casa do maradona é esta. Perguntam, e bem, se não podia ter arranjado um url maior... O rapaz gosta de dar trabalho às pessoas. Falamos no dia 5, meu menino.
A nova casa do maradona é esta. Perguntam, e bem, se não podia ter arranjado um url maior... O rapaz gosta de dar trabalho às pessoas. Falamos no dia 5, meu menino.
quarta-feira, dezembro 01, 2004
Blockbomba: The Stepford Wives (de 1975), Zatoichi (desenho animado com pessoas; e a música, senhores, a música...)
Bomba de Ouro: "Eu, para que ninguém sofra mais, porque estas coisas sempre custam, e fazem despesa, e alvoraçam (atrasei hoje páginas de leitura) alvitro que se contrate para a governação um bom gerente de hotel suiço. Ficávamos todos melhor servidos", no favorito Impensável.
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