blogue de carla hilário de almeida quevedo bombainteligente@gmail.com

sábado, maio 31, 2003

Os Globos de Ouro, Coliseu dos Recreios, Lisboa, ontem

Este ano consegui aguentar o espectáculo até ao fim da segunda parte. As pessoas de bem habitualmente saem antes do final da primeira parte, porque sabem que o mais engraçado é o jantar no Gambrinus e a festa que se seguem (sobretudo o primeiro). Este ano, havia alguma curiosidade pateta em saber se o Herman aguentaria a pressão ou não. Além disso, sabia-se que seria um espectáculo sóbrio de entrega de prémios. Assim, aguenta-se.

Dos Globos destaco as coreografias maravilhosas que acompanharam aquele tema tão jeitoso do Luis Filipe Reis e a do Momento do Pedro Abrunhosa. As russas vestidas de vaqueiras, com calções diminutos (nada contra, juro-vos) a abrirem e a fecharem as pernas suscitaram em mim um sentimento quase de terror. Os circenses que acompanharam o Pedro Abrunhosa fizeram uma coreografia lá deles. O sentimento de piedade veio por ocasião do discurso de agradecimento da Catarina Furtado, revelador de um desesperado pedido de emprego à SIC. Senti muito a ausência do Pedro Namora e do Adelino Granja. Mas o coirão da Felícia lá estava.

Mas vamos ao que interessa: o jantar no Gambrinus. Quero dizer que não volto ao Gambrinus porque ali já não se come bem. Os famosíssimos croquetes estavam massudos e picantes, as torradinhas outrora objecto do meu desejo estavam frias, o clássico meio bife não sabia a nada, as batatas fritas estavam cozidas... Horror! É que nunca mais. Ah! E a boazuda da Alexandra Lencastre estava sentadita ao meu lado. Sempre que a rapariga - de quem gosto muito - abria a boca, eu pensava: "É o Pipi! A Alexandra é o Pipi!" E isto pela linguagem e sobretudo pela graça e a inteligência com que a utilizava.

Por volta das quatro da manhã chegámos à festa no chatíssimo ex-T-Clube. Os fotógrafos já tinham ido dormir e perderam a Maria João Bastos a dançar descalça em cima dos sofás, a Marisa Cruz, a estilista Fátima Lopes e o marido todos juntinhos a fazerem fila para a casa de banho, todos juntinhos a dançar, todos juntinhos a sair, a cretinice do Jorge Mourato (que não é fotografável, ou talvez...), a magreza inesperada da Margarida Martins, a felicidade do casal Nabais. Mas estas festas do social têm poucas excitações; o máximo que pode acontecer é ver-se uma rapariga descalça, de resto... a verdade é que são lentas. A festa dos Manéis, em Abril, foi muito mais divertida e tenho esperança de ver alguma coisa desviante no almoço de amanhã na casa de um barão holandês decadente.

sexta-feira, maio 30, 2003

A partir de hoje, a época das festarolas está oficialmente inaugurada; which is nice, porque a Antiguidade Clássica e as etimologias são temas limitados. O próximo post será sobre os Globos de Ouro.

quinta-feira, maio 29, 2003

O grande egoísta que tem o palimpsesto com a parte da Poética referente à Comédia escondido debaixo da cama, que me escreva para bombainteligente@hotmail.com.
Na mesma aula

Aluna soporífera segunda: Quando lemos um livro sentimos a catarse; sentimos um alívio. É como se fosse uma espécie de cura.
Eu: Depende do livro. Só a perspectiva de ter de ler o Horace, de Corneille, me provoca vómitos.
Professor: Pronto, Carla...
Faculdade de Letras de Lisboa, há umas horas

Professor: O que é a catarse?
Aluna soporífera: É uma viagem, uma projecção daquilo que somos e o seu retorno a nós mesmos; é uma espécie de estranhamento e entranhamento.
Eu: Pois, é a Coca-Cola da Antiguidade...
Quero agradecer ao Frederico Lourenço por ter traduzido a Odisseia. Estou a ler de lagrimita ao canto do olho... Não morras nunca, Frederico!
Cenas da vida conjugal

- Não há nada pior que um gajo invejoso.
- Pior é ser serial-killer.
- Pois é, querido.

quarta-feira, maio 28, 2003

Gosto tanto do Jornal 2. Ainda há pouco ouvi uma jornalista no Tribunal de Monsanto a dizer o seguinte: "Será por esta porta que entrará Paulo Portas..."
Os brasileiros Pró-Tensão e Milton Ribeiro e o argentino Libros No conferem ao bomba inteligente o reconhecimento internacional por que tanto ansiava. Daqui a um nadinha estou a cantar no Olympia de Paris, ó se estou!
Também quero dar para o peditório das releituras e dizer que releio diariamente o abrupto e o pipi, o gato fedorento e a coluna infame, o modus vivendi e o tradução simultânea e releio, releio, releio...
É A CULTURA, ESTÚPIDO!

E é o último debate antes do Verão. No dia 4 de Junho, o Jardim de Inverno do São Luiz recebe a última volta ao mundo pelos livros do mês desta temporada. Anabela Mota Ribeiro faz a moderação do debate que conta ainda com a presença de alguns dos mais representativos críticos literários da nova geração, como Pedro Mexia e José Mário Silva. A componente mais "polémica" está a cargo de dois representantes de tendências políticas opostas – o colunista de O Independente, João Pereira Coutinho, e Daniel de Oliveira, colunista de A Capital. Desta vez, o convidado especial é Pacheco Pereira que vai falar sobre a sua experiência como um dos mais destacados "bloguistas" da "blogosfera portuguesa". No final do encontro, Ricardo de Araújo Pereira fala das "misérias" da nossa vida literária num número de stand-up comedy. Marque esta data na margem do seu livro favorito – 4 de Junho, ao fim da tarde… É a Cultura, Estúpido!

(Hehe... antecipei-me a postar isto. Julgo que desta vez vou estar presente... ou talvez não.)
Há uns dias, no meio de um post sobre umbigos, lancei uma provocação que de provocatório e inovador tem pouquíssimo: "Homero não existiu." Sobre esta frasezita recebi duas mensagens que passo a transcrever. A primeira é da Ana Albergaria e a segunda, do Cruzes Canhoto. A resposta segue depois.

Querida Charlotte

Podia estar aqui com rodriguinhos, mas tu e eu temos mais que fazer e portanto vou já ao busílis: Homero não existiu? Por favor, não me digas isso outra vez que eu juro que me mudo já para Felgueiras e desato a esbofetear políticos! E olha que falo sério! Não existiu??? Snif... isso não se faz; despedaçar assim o imaginário de uma rapariga homérica como moi même. Agora aceita um grande beijinho desta tua amiga Ana.


Cara Charlotte

Ia escrever para dizer que, mesmo não me chamando menino Jesus, gosto das tuas explicações etimológicas. Mas aquela do Homero não existir fez-me pensar duas vezes. A teoria mais aceite sobre o Homero actualmente é de que teria existido, mas seria apenas compilador de várias tradições orais? Porque achas que não existiu?


A presunção da omnisciência dá-nos muito jeito para falarmos sobre os vultos da Antiguidade (e sobre autores modernos, for that matter). Permite-nos falar sobre eles como se tivessem existido e os tivessemos conhecido. Acerca da existência de Homero sempre tive grande desconfiança (como se isso fosse alguma coisa de extraordinário) e essa dúvida surgiu por causa do significado do nome do autor: 'Omiros significa "uma promessa de união".

Além disso, persistem dúvidas sobre os dialectos utilizados na narrativa (são quatro), discordâncias entre estratos linguísticos e arqueológicos e incertezas quanto à fixação da data de concepção dos Poemas. Quem tenha lido a Ilíada (bocejo profundo) ou a Odisseia, lembrar-se-á das repetições constantes do discurso e das qualificações também repetidas até à exaustão das personagens. Lembram-se do Ulisses, o dos mil artífcios? As repetições (que tornam o texto muito maçador, os classicistas que me perdoem) provam que os Poemas eram um conjunto de histórias da tradição oral e que a necessidade de classificação das personagens estava relacionada com o processo de memorização; assim toda a gente sabia quem era o Ulisses, por exemplo.

Homero não existiu porque quem conta um conto acrescenta um ponto e quem o anda a contar há quase três mil anos já se perdeu há muito. Agora, penso que é preferível dizer: Homero não interessa. Ou melhor, Homero não é para aqui chamado.

terça-feira, maio 27, 2003

O pastilhador carne enviou-me a seguinte mensagem:

Exma. Senhora Dona... Bomba

Permita que venha, não tanto formular uma pergunta, mas sobretudo requerer uma resposta. O que é diferente. E se me debruçar sobre esse tema uns minutos até lhe consigo explicar porquê. Mas agora não há tempo.

Nem agora nem nunca. Nunca houve tempo, o tempo não existe, isso é uma invenção dos religiosos, dos políticos e dos comerciantes... Bom, o tempo existe enquanto figura de estilo, não mais do que isso... Isto é, se ele de facto existisse podiamos debater o assunto à vontade, mas a prova de que o tempo não existe está, precisamente, em não o termos para isso. Para o debate... sobre ele próprio... E se não temos tempo para discutir o tempo, é bom sinal. De contrário estariamos a discutir uma coisa que não existe. E isso seria um desperdício... de tempo. Bom... Deixei cair cinza do cigarro em cima do teclado.

Mas vamos ao assunto sobre o qual se requer competente resposta: o que é isto que me impede de desistir?


Ora ainda bem que me faz essa pergunta... ou que me requere essa resposta. O que o impede de desistir é não acreditar em nada do que diz. Deve ser por isso que o carne pode ser escritor.
O Tradução Simultânea já avançou com a suspeita mais interessante da blogosfera: o Pipi pode ser uma gaja (arrisco-me a que a teoria da hiper-heterossexualidade caia por terra, mas não faz mal; a piada é mais importante). Se esta suspeita se confirmar (tudo indica que sim), está encontrada a musa para os infames. Sim, porque não me enganam: a Maria Bocchichio é um conhecido napolitano de barba rija.
Porque é que a secção Pedofilia (agora temos uma secção Pedofilia a par das secções Regional, Nacional, Internacional, Desporto...) do Diário de Notícias ínclui notícias como a do depoimento de João Soares sobre o caso Moderna, a possibilidade de haver outro apresentador para os Globos de Ouro, os comentários de Santana sobre a "birra" de João Soares etc.? Será um exemplo de mau jornalismo? Nã...
Começo o dia por saudar dois novos blogues: o 7000 nomes e o Agent Provocateur. Bem-vindos à blogosfera!

segunda-feira, maio 26, 2003

Ramos de flores e bombons para bombainteligente@hotmail.com.
A atitude tranquila do Herman José é a de alguém protegido pelo humor que só a distância permite.
Acabo de passar pelo bordel mais conhecido de Portugal. Estou a falar do Palácio das Necessidades, claro.
Correspondente da SRA, em Pequim

Para começar a semana em beleza, nada melhor do que uma crónica da Nani, directamente do epicentro da doença.

When the East meets the West

Com a SRA à solta e os restaurantes fechados ou vazios, as opções alimentares limitam-se à casa própria ou à casa alheia. Devido a alguma (há quem prefira a palavra notória) falta de jeito para o diálogo com os tachos, aceito sempre de bom grado a generosidade e o génio alheios.

Num desses dias felizes, depois de saborear os múltiplos pratos que alguns amigos chineses prepararam, tive o vídeo do casamento de um deles à sobremesa. Já estava preparada para algumas poses mais estudadas e para os efeitos especiais da montagem, mas como eu própria tinha assistido ao casamento não esperava outras revelações de maior.

Os primeiros minutos decorreram dentro das minhas previsões, mas eis senão quando a banda sonora do vídeo se torna, por fim, conhecida aos ouvidos ocidentais. Seria possível? Era. É. "Noite Feliz" (sim, essa mesmo, o Silent Night de Natal) a acompanhar a noiva vestida de branco a chegar ao local onde decorreu a festa. "Noite de Paz, O Senhor, Deus do Amor, lá, lá, lá, lá." "Mas isto é de Natal!", digo eu, de olhos arregalados, dedo indicador e reprovador em riste. "E depois? O que interessa é que soa bem..." foi a descontraída resposta que obtive dos meus anfitriões, que continuaram embalados e embevecidos a olhar para a noiva e a cantarolar o nascimento do Menino...

Uns minutos mais à frente, é chegado o momento em que os noivos brindam com um copo de vinho tinto, de braços romanticamente entrelaçados. Talvez seja importante referir que os casamentos chineses contratam muitas vezes um entertainer, uma espécie de apresentador que vai conduzindo o espectáculo e orientando os vários sketches dos noivos. Era, pois, a deixa do vinho. Como normalmente um copo de vinho é mais do que suficiente para entornar a lucidez de uma chinesa bem comportada, resolvi perguntar o que já durante o casamento me tinha intrigado. Ou seja, como tinha ela conseguido fazer frente ao poderoso líquido naquele dia. Sorriso malandro a fazer-me pressentir o pior: "Era Coca-Cola. Nos casamentos chineses brindamos quase sempre com Coca-Cola para os noivos não ficarem tontos. Ao longe parece vinho..."

Por mais que tentasse adoptar uma expressão favorável à multiculturalidade tinha na testa as palavras "grande aldrabice" escritas em letras maiúsculas, garrafais, vermelhas e a piscar. De repente, lembrei-me de uma semelhante história de adaptações, mas originada do lado ocidental do mundo, e conciliei-me com os chineses. Há uns anos, folheava eu o suplemento de domingo do vizinho El País, quando deparo com um artigo sobre a decoração inspirada no Oriente. Incluía a necessária fotografia com vários móveis e objectos ditos exóticos, todos convenientemente datados de uma qualquer dinastia, e um par de almofadas com os inextricáveis caracteres chineses. A legenda descrevia a cena e o ambiente nos habituais termos místicos e nebulosos. Referia-se em particular às almofadas como uma hábil, elegante e moderna forma de aproveitar os sacos onde, naqueles tempos muito antigos, se guardava e transportava o inspirador chá chinês. Mas os caracteres revelavam, infelizmente, um conteúdo bem diferente: era de sacos de batatas que se tratava. Segundo uma amiga chinesa, é sinal de muito mau gosto, com direito até a alguma perda de face, colocar um material tão reles, barato e de uso tão vulgar em exposição numa sala de estar.

Bem dizia Confúcio: "do not disobey the rites". (Analectos, 2.5)

Nani, no meio deles todos

domingo, maio 25, 2003

Belíssimos os textos do Modus Vivendi. Todos, sem excepção. De uma qualidade, uma elegância e erudição notáveis. A Ana não o sabe mas é escritora. E ainda por cima, é uma mulher bela e alegre. Porque o segredo está nas mulheres letradas, bonitas e alegres, entusiastas e de bem com a vida. Tive o prazer de partilhar umas horas de conversa com a Ana e queria dizer-lhe que a Kristeva, ao pé dela, era uma menina!
Quanto aos comentários da Piolheira (que desde já saúdo), gostaria de dizer o seguinte:

1. o que escrevi em relação à entrada do Abrupto na blogosfera foi o seguinte: "julgo que não é suficiente entrar na blogosfera para dizer se temos de fazer isto ou pensar sobre aquilo." Também eu queria ouvir a opinião do Pacheco Pereira sobre este assunto aqui na blogosfera, espaço independente e descomprometido em que vigora a liberdade de expressão;

2. precisamente por estar "dentro de algo em que não estamos" (na política, mind you) é que o JPP tem, com certeza elementos essenciais que nos pode ajudar a compreender o que se passa, nomeadamente o funcionamento do Ministério dos Negócios Estrangeiros e como é possível que ex-ministros ponham em causa o processo judicial;

3. concordo que não haja espaços fechados para pessoas como o Pacheco Pereira (esta frase não é irónica, nem agressiva), o que é uma pena, porque temos de ouvir na rádio ou na televisão o que não diz aqui.
Quanto ao post do José Pacheco Pereira, gostaria de dizer o seguinte:

1. falar sobre os recentes acontecimentos não passa necessariamente por acusações ou lançar boatos;

2. dizer que não há mais nada a acrescentar parece-me fraco porque a situação mudou muito desde que o Carlos Cruz foi preso;

3. quanto ao comentário sobre se queremos saber mais alguma coisa, podemos ouvir o programa de rádio, give me a break!

sábado, maio 24, 2003

Já que estou numa noite de particular inspiração, aproveito para responder às questões enviadas pelo José Duque a respeito da teoria da hiper-heterossexualidade:

Ser hiper-heterossexual é ser garanhão?
Não.

Só gostar de mulheres bonitas é ser "sensível" e "pouco-homem"?
Depende da idade.

O Guterres e o Jorge Sampaio são hiper-heterossexuais (garanhões)?
Primeiro o Guterres. Em princípio, a primeira mulher do Guterres não era excepcionalmente feia e a actual está também dentro dos parâmetros de gosto. Concluindo, o Guterres, apesar de ter sido um péssimo primeiro-ministro, é um português normal, sem excessos, nem para um lado, nem para o outro. Com o Sampaio passa-se outra coisa. Quem conheça minimamente a vida afectiva do nosso Presidente sabe que sempre gostou de mulheres enormes e autoritárias, e tem todo o direito do mundo a esse gosto. A teoria do meu marido só se aplica numa progressão mais ou menos saudável, mais ou menos natural e mais ou menos urbana. É sabido que a virilidade rural está acima de qualquer buço, sobrancelha ou pilosidade.

A teoria também se aplica às mulheres?
Não, nada. As mulheres são mais inteligentes.

E mais, mais, mais: desde quando é que a blogosfera se converteu numa série de telejornais? E desde quando é uma repetição de uma repetição?
A Coluna Infame escreveu o seguinte post: "Como já se escreveu, deste caso sairá terrivelmente manchado o poder político ou a Justiça. Qualquer das hipóteses é terrível, e configura uma crise que pode ser a mais grave da III República."

Parece-me haver aqui um erro. Isto não é um jogo de futebol. Se a Justiça se enganou no fim de tudo, isso aconteceu porque existiram situações equívocas ou duvidosas. O poder político tem obrigação de não dar lugar a situações equívocas ou duvidosas. Não são cidadãos comuns. Nesse caso, a Justiça não se enganou; percebeu a situação duvidosa ou equívoca dos políticos envolvidos. Ou seja, o problema nunca é da Justiça, mas dos políticos que têm de estar acima de qualquer suspeita desde o momento em que assumem os altos desígnios que a sociedade pública lhes concede. E, por isso, insisto: o Presidente da República (como máxima magistura) não pode dizer que "não abandona os amigos". Não se trata de condenar antes do julgamento. Simplesmente, ninguém pode falar de solidariedade partidária ou institucional ou pessoal quando se trata de representantes do Povo.
E ainda mais uma coisa: então é mesmo verdade que os funcionários e responsáveis do Ministério dos Negócios Estrangeiros são paneleiros, estão impunes, acima da lei, são uma raça à parte do funcionalismo público? Cambada de queques decadentes, protegidos por políticos provincianos fascinados pelas boas maneiras e pelos apelidos. Conta lá a verdade, ó Abrupto.
E mais uma: percebo todas as perversões sexuais consentidas entre adultos; não compreendo - nem quero compreender porque compreender é uma maneira de perdoar - perversões sexuais com crianças.
Só mais uma coisa: quem foram os responsáveis do Ministério dos Negócios Estrangeiros que deixaram que o Jorge Ritto existisse e progredisse na carreira diplomática quando na Alemanha e na África do Sul e, sei lá onde mais, houve episódios ilegais protegidos pela imunidade diplomática?
Acordem, caramba!

1. Acredito nas Instituições (na Polícia Judiciária, na competência e responsabilidade dos juízes, na seriedade dos processos) e não percebo as teorias sobre cabalas ou conspirações.

2. Quanto ao comentário do Pedro Mexia, em resposta a um e-mail sobre o assunto, compreendo que seja o mais cuidadoso que se pode ter neste momento tão grave. Mas, sinceramente, esperava maior revolta.

3. Perturba-me que na blogosfera muitos blogues se tenham abstido de comentar a detenção de Paulo Pedroso ou as suspeitas sobre Ferro Rodrigues, e confunde-me o silêncio quase corporativista do Abrupto. Por muito respeito que tenha pelo Pacheco Pereira, julgo que não é suficiente entrar na blogosfera para dizer se temos de fazer isto ou pensar sobre aquilo. Já que está dentro de algo em que não estamos, que contribua para que possamos compreender o que se passa. Que diga aqui aquilo que não pode dizer ali.

4. Alguém me pode explicar como um ex-Ministro da Justiça põe em dúvida a seriedade de um Procurador da República, que ele próprio nomeou? E, já agora, que alguém me explique como o Presidente da República pode dizer (ouvido no Telejornal), referindo-se a Paulo Pedroso, que "embora acredite na Justiça, não abandona os amigos". Um Presidente da República não tem, não pode ter amigos. Tem um Povo a defender, em que ninguém pode ficar impune.

5. Quero ainda dizer que me estou nas tintas para a culpabilidade ou inocência do Carlos Cruz. É preciso não esquecer que se trata de um mero apresentador de televisão, com alguma capacidade financeira, mas com uma intervenção mínima na sociedade. Se o homem é um perverso associal, há formas de o punir. Não podemos comparar a situação do apresentador da Bota Botilde com a de médicos, advogados, embaixadores e agora políticos, que têm privilégios e deveres superiores ao ser comum. Tudo isto é profundamente terrível porque se trata de pessoas com responsabilidades e poder. Por amor de Deus, não sejamos indiferentes ante este escândalo.

quarta-feira, maio 21, 2003

A propósito dos posts escritos pelo Cruzes Canhoto e o Modus Vivendi acerca da exposição da privacidade, lembrei-me de um poema belíssimo de Konstandinos Kavafis. Em vez de vos trazer a tradução inglesa, preferi traduzir o poema do original (detesto a versão do Jorge de Sena e, infelizmente, o Joaquim Manuel Magalhães não o incluiu nos poemas traduzidos em colaboração com Nikos Pratsinis; uma edição excelente bilingue da Relógio d' Água). Espero que gostem.

O mais que puderes

E se não conseguires fazer da tua vida o que queres,
então pelo menos tenta-o,
o mais que puderes; não a humilhes
no contacto abundante com o mundo,
nas muitas acções e palavras.

Não a humilhes no vaivém
constante, expondo-a
à estupidez diária
de relações e ligações
até que se torne um fardo estranho.

(Konstandinos Kavafis, 1913)
Gostaria de dizer que os seguintes blogues passaram a fazer parte da minha leitura diária: Ponto e Virgula; Bicho Escala Estantes e Pró-Tensão. Cada um com o seu estilo e todos imperdíveis.

Mukankas, os dias de amuo já passaram. Let bygones be bygones.

terça-feira, maio 20, 2003

Sobre a notícia do adepto do Futebol Clube do Porto que morreu afogado em Sevilha, o comentário do meu marido foi o seguinte: "E quem terá ficado com o bilhete?"
Correspondente da SRA, em Pequim

Propaganda atípica

Desta vez o embelezamento de Pequim não se faz com recurso à temática do Natal, que os chineses adoram em qualquer época do ano (afinal de contas, porque é que as árvores com luzinhas às cores hão-de ser só em Dezembro se é Natal sempre que o homem quiser?). Não. Pequim está enfeitada com múltiplas faixas e cartazes a apelar ao combate à SRA. As faixas vermelhas com os dizeres a branco são penduradas em pontes, passagens aéreas para peões, árvores, postes e suportes afins. O seu conteúdo "atípico" é bem mais evidente do que no caso dos cartazes publicitários em paragens de autocarro e outdoors gigantes no topo de muitos edifícios. Parecem anunciar apenas mais um produto de grande consumo, mas lá estão os dois caracteres "feidian", a abreviatura usada para dizer SRA em chinês e que significa "atípico", a denunciar o seu conteúdo mais... social?

As mensagens, bem ao estilo da Revolução Cultural, são qualquer coisa como: “As massas unidas combaterão a SRA”, “Juntos venceremos a doença”, "Vivam as enfermeiras e os médicos", "Lutemos por um bairro saudável", em tradução porventura mais fiel ao espírito do que à letra. O grande pai comunista encarrega-se de levantar o moral às tropas e garante-nos que o povo unido vencerá a SRA.

E o que pensa disto o povo assim unido? Entre amigos, taxistas, empregados de mesa, lojistas e transeuntes, numa amostra cuja margem de erro não será certamente de desprezar, a resposta é unívoca: tretas do governo. Desenganem-se, pois, os que pensavam estudar o fenómeno da mobilização das massas na China do século XXI... As massas não estão para aí viradas e, muito pelo contrário, desconfiam cada vez mais de tudo o que é oficial.

Que pena! Logo agora que eu pensava que estas faixas e cartazes até podiam ser uma boa exportação para Portugal, para pelo menos nos ajudar a boiar no meio da crise económica...

Nani, no meio deles todos
Quero falar-vos do meu pipi. Do meu, não (lá chegaremos porque a falta de tema toca a todos); do dele.

Este rapaz escreveu que gostaria de fazer a Lourdes Norberto, o que me leva à teoria do meu marido que diz que o nível de heterossexualidade se mede pela qualidade das miúdas que se fazem. Ou seja, um homem é mais heterossexual se consegue (ou deseja) fazer a Lourdes Norberto ou a Dina Aguiar (sugiro que a próxima seja a Inês Pedrosa). Quanto mais feias, velhas, gordas, repulsivas e burras melhor. Este fenómeno de hiper-heterossexualidade passa-se durante a adolescência e começa a esmorecer (ou a apaneleirar-se) a partir dos trintas. Quanto mais os homens avançam na idade, mais requisitos exigem das raparigas: que sejam bonitas, tenham umbigos perfeitos, unhas dos pés arranjadas, orelhinhas nha nha nha, e que sejam inteligentes, letradas, cultas, tenham boas maneiras etc. (bocejo). Esta teoria do meu marido está prestes a passar a verdade absoluta (resta-nos a comprovação do Pipi). Por tudo isto declaro que o Pipi é o gajo mais heterossexual da blogosfera! Bem-vindo!
Breve diálogo com o meu adorado pai (médico):

- Pai, parece que há agora umas drogas novas para o Alzheimer, preventivas da doença, para a memória...
- A única maneira de prevenir o Alzheimer é morrer antes de a doença se manifestar.
O caso da ghost-writer Alexandra Solnado nem me provoca grande vontade de rir. O meu sentido de distância tem um ponto fraco - as doenças mentais. E se não há distância, não pode haver humor. A psicótica Solnado já não vive há um ano entre nós, os neuróticos. Olha, menos uma (tentativa de piada totalmente falhada, como se esperava).

segunda-feira, maio 19, 2003

Correspondente da SRA, em Pequim

A minha querida amiga Nani escreveu mais uma crónica deliciosa, desta vez sobre a confusão dos nomes em chinês.

Homofonias orientais

A língua chinesa não se presta apenas a confusões embaraçosas. Também as há premonitórias.

Assim, Wen Jiabao, o Primeiro-Ministro que chegou mais ao menos ao menos tempo que a pneumonia, tem a infelicidade de poder ver a palavra chinesa para peste ("wenyi") formada com o seu apelido (nota: o apelido vem primeiro nos nomes chineses). Pelo contrário, Wu Yi, a muitas vezes chamada dama de ferro oriental, designada para salvar a Nação desta pestilenta crise, tem a sorte de o seu nome poder também significar que não há peste: "wu" – negação, "yi" – peste.

E há quem lembre que o karma dos nomes não é novo. Jiang Zemin teve direito a cheias devastadoras como baptismo de presidência. Os mais atentos lembraram que "zemin" pode também entender-se como "gente encharcada". Ainda não foi encontrada homofonia adequada para Hu Jingtao. But who's Hu anyway?

Nani, no meio deles todos
O Miguel Esteves Cardoso menciona alguns blogues nos genéricos e nas cápsulas do consultório Pastilhas. Iupi! Obrigada, Miguel! E um grande beijinho de saudades. Que bonita maneira de começar a semana.

domingo, maio 18, 2003

O Possidónio Cachapa (sim, eu faço um link sempre que falo de algum blogador) ataca-me no seu blogue. Bom, antes de mais quero dizer que não se trata de rancor, mas simplesmente de não gostar do que o rapaz escreve. Simples. A vaidade do Possidónio Cachapa é tanta que nem acredita que se possa não gostar do que escreve. Basta dar uma espreitadela ao seu blogue ou lermos o artigo repleto de banalidades publicado na última edição da Egoísta para percebermos que se trata de um caso único em que o nome do autor se adequa ao seu tipo de escrita.
O Pedro Lomba, o nosso angustiado umbilical de serviço, respondeu às minhas questões. Seguem a carta do infame e a minha reacção.

Minha cara Charlotte

Vejo que temos um interesse em comum: os umbigos. A Xantipa também é uma personagem fascinante e eu bem sei que não goza de boa reputação no nosso mundo ("by the way", um rumor que dura dois mil anos é ainda um rumor?). Mas falemos de umbigos. O meu problema com os umbigos é o mesmo problema que possuo com toda a nudez humana pouco transcendente. A exibição dos umbigos é a exibição da nudez que não interessa ver. A beleza falsa, a beleza irrealizável. É a beleza dos tornozelos, das unhas, dos cotovelos, das sobrancelhas, das pestanas, das narinas, das virilhas, das orelhas (há alguma beleza num bom par de orelhas?), dos tornozelos, dos pés, dos dedos dos pés... Já pensou bem nos dedos dos pés? No dedo mindinho? No polegar? Digo-lhe: o ser humano devia ser obrigado a andar de meias nas praias. Quanto ao número de dedos, digo-lhe que me sinto perfeitamente satisfeito com os dez que tenho mas admito repensar a coisa.

É assim Charlotte. Os umbigos são perigosos. Tenho-os em má conta. Causam-me desconfiança. E não esqueça que, frequentemente, o umbigo encima uma generosa pança, o que piora as coisas. O meu post foi um manifesto anti-umbilical. Ou seja, um manifesto contra a estética do umbigo. Mas não me creia mal. Eu procuro ser construtivo.

Espero ter resolvido as suas dúvidas metódicas. Desconhecia a origem da palavra e agradeço-lhe a lição. Só não percebo porque é que áfalos é sem falo? Por que não "ao falo", isto é, perto do falo?


Antes de mais, sobre a Xantipa. Um rumor com dois mil anos é uma verdade! A Xantipa era uma mulher má como as cobras e não se fala mais nisso. Já vai sendo altura de começarmos a resolver os problemas da Antiguidade Clássica e de andarmos para a frente! Aproveito desde já para resolver outro: Homero não existiu.

Para o Pedro, há uma beleza má (inferior) e uma beleza boa (superior ou transcendente) na nudez humana. Ou seja, há partes que se devem esconder a todos o custo e outras aceitáveis que se podem mostrar ao mundo. Tudo porque é complicado definir o que é um umbigo bonito ou umas orelhas perfeitas. Discordo. E macacos me mordam (adoro esta expressão) mas tenho de voltar aos cabrões dos gregos. Nesta altura da discussão é importante definir a palavra beleza e nada mais útil do que a etimologia para nos ajudar nessa tarefa (bocejo). Omorfiá significa beleza, em grego moderno - a mesma forma. Se olharmos para as estátuas gregas, percebemos que o fundamental é a harmonia e a proporção. Não vemos um olho maior do que o outro, nem um braço mais curto e outro mais comprido. Tudo obedece a uma determinada escala e o umbigo, os pés, as orelhas etc. fazem parte deste conjunto harmónico. É por essa razão que a cara da Elizabeth Hurley é considerada perfeita.

Se os umbigos causam desconfiança ao Pedro tenho duas sugestões: análise e que passe a frequentar locais onde haja uma grande probabilidade de encontrar umbigos perfeitos.

Por último, a palavra áfalos. O prefixo a- em grego significa sem ou fora de (acéfalo, atípico, anormal). Assim, áfalos nunca poderia significar "ao falo" ou "perto do falo".

sábado, maio 17, 2003

Iupi! Obrigada ao Gato Ricardo que me ajudou na complicadíssima tarefa de instalar o contador no bomba. Como gostei do número 25.000 indicado pelo Blog de Esquerda, decidi começar a contar as visitas a partir daí, contando, claro, com as que com certeza já tive até agora neste mês e meio de existência. 25.001, 25.002...
Estive às voltas com o sitemeter e nada. Não consigo que o bomba tenha o seu próprio contador. Resta-me desatar e espernear furiosamente no chão e arrancar os cabelos. Se não quiserem assistir a este terrível espectáculo (que muito facilmente se torna um tema para desenvolver e postar no blogue), por favor enviem-me instruções para bombainteligente@hotmail.com. Ricardo! Socorro!
O Tanga Zona mencionou o bomba inteligente e o tangaman enviou-me um e-mail gentil a dizer que o bomba era um dos seus blogues de referência. Fiquei uns dias a pensar nisto: se o bomba é um blogue de referência para outro cuja palavra tanga o descreve, o melhor será, talvez, fechar as portas e dedicar-me aos benefícios dos raios solares. Bem-vindo à blogosfera!
De costas viradas para o televisor, ouvi a população de Felgueiras a insultar Francisco Assis. Mas foi o comentário do jornalista Daniel Catalão, da RTP, que mereceu a minha atenção: "As pessoas estão furiosas; estão fora delas." A partir daí a coisa descambou.
Quem quiser comentar as crónicas da correspondente em Pequim, já sabe: bombainteligente@hotmail.com. Por acaso, julgo que aquele último parágrafo pede um comentário, ó se pede!

sexta-feira, maio 16, 2003

A Ana Vivendi voltou a mencionar o bomba e a deixar-me toda esborratada de lágrima ao canto do olho. Obrigada! Quando é que o Modus arranja uma morada de e-mail?
O colunista infame Pedro Lomba anda angustiado com os umbigos que nesta época de calores se revelam. Diz o Pedro: "Entendam-me: não são os umbigos a causa das minhas lamúrias; é a sua beleza falsa, é a sua beleza irrealizável que me provoca tremores. Se a moda continua, garanto-vos que me planto nas maternidades o tempo que for preciso. E o umbigo das próximas gerações será um umbigo fechado." Como se separa o umbigo da beleza do umbigo? Qual o significado de beleza falsa? E de beleza irrealizável? Um umbigo não é uma coisa do género "what you see is what you get" mesmo que disfarçado com um piercing? Um umbigo prometerá algo que não está à vista? Obviamente, o Pedro não gosta de umbigos. Também não gosta dos pés? Acha que têm dedos a mais ou dedos a menos?

Mas basta de perguntas. Se o Pedro quiser responder a alguma destas questões poderá fazê-lo para bombainteligente@hotmail.com. Como não resisto, vou impingir-lhe a etimologia da palavra. Áfalos quer dizer umbigo, em grego moderno. Ou seja, sem falo. (Esta foi a explicação etimológica mais curta da história. Estou a aperfeiçoar a técnica de não aborrecer as pessoas com coisas que não interessam nem ao Menino Jesus.)
Correspondente da SRA, em Pequim

A minha querida amiga Nani escreveu uma nova crónica sobre o que se passa nesse país do absurdo - a China. Imperdível!

A cidade proibida

O estatuto de persona non grata é um rótulo tramado. Mas é assim; ser de Pequim, vir de Pequim, morar em Pequim, ter passado em Pequim, gostar de Pequim, referir Pequim é o mesmo que dizer “bom dia, trago comigo a pneumonia atípica”. Ninguém nos recebe, ninguém nos quer. Dentro de Pequim também há segregações e os bairros menos afectados rejeitam os mais desgraçados. Para não falar do infeliz indíviduo que tussa, espirre ou ande com olheiras... ostracismo e primeiro lugar garantido numa fila de supermercado.

Dá-me vontade de rir quando me perguntam “porque é que não sais daí?” Mas para onde é que hei-de ir? Por acaso os meus queridos amigos em Portugal receber-me-iam de braços abertos no aeroporto? Ou arranjariam desculpas variadas durante os primeiros 15 dias para não me verem? Pois se até o amigo norte-coreano acabou com os voos para Pequim... E que eu saiba não têm voos para mais lado nenhum, por isso a coisa é mesmo grave. Claro que é sempre possível visitar Pyongyang mas primeiro há que passar por uma quarentenazinha de 10 dias num hotel a preceito preparado para a ocasião, com água corrente quente e fria mas só de manhã e a 100 dólares por noite e por nossa conta, claro está. Promoção a não perder.

Shanghai também não nos quer lá. Aterrar dá direito a 14 dias de quarentena, também pago pelo bolso dos próprios suspeitos.

Noutras províncias são ainda mais práticos: se vem de Pequim, não há hotel que o receba. O nosso simpático aeroporto tinha noutro dia uma tabuleta a indicar os únicos hotéis dispostos a arriscar e aceitar os perigosos Pequinenses.

Então e os maravilhosos arredores de Pequim? Admitindo que se conseguem furar os vários controlos mais ou menos oficiais e passar o teste implacável do termómetro, o novo objecto fetiche chinês, sobra a ira dos camponeses que reagem de forma muito mais eficaz à visão de uma matrícula de Pequim: à pedrada.

Em Portugal, a perspectiva é ainda mais aterradora. Aterrar na lusa pátria dá direito a cobertura mediática personalizada. Porque o nosso povo prefere sempre comover-se com o caso individual a ter de aturar análises aborrecidas sobre impactos económicos e políticos de pestes asiáticas em terras tão distantes quanto desconhecidas. And I don't want to be a SARS star.

Uma última palavrinha, em jeito de comentário às declarações de um médico do Hospital de S. João no Porto (onde U-M, repito UM suspeito fez as aberturas dos telejornais durante algum tempo) que dizia que em Portugal a situação nunca seria tão grave como na China porque as condições hospitalares são muito melhores. Que tal receber 3000 doentes de uma assentada ao abrigo de um projecto filantrópico de cooperação e desenvolvimento com a República Popular da China?

Nani, no meio deles todos.
Ontem saí de casa com o objectivo de arranjar tema para o blogue. O meu destino era a loja da Ana Salazar, na Av. de Roma, a qual planeava saquear legalmente. Os meus contactos com o mundo exterior são cada vez mais raros, o que me torna mais agressiva e intolerante com os outros; os estranhos. Daí que dê por quase como certo um conflito quando me aventuro fora dos meus domínios. Às vezes, engano-me. Foi o caso desta minha ida à loja da Ana Salazar. A roupa era gira, a empregada simpaticíssima e nada chata a tentar impingir a mercadoria, a falar bem, sem dizer frases idiotas, tudo com as palavras certas. Foi tão bom que decidi voltar, para levar o resto da loja e para ver se conseguia implicar com alguma coisa. Nada. Diacho! Lá vou ter de voltar à etimologia.

quinta-feira, maio 15, 2003

Vou ter de adiar o meu post sobre a Ana Salazar para responder à mensagem do Mukankala.

O Nuno disse que tinha um problema com a palavra autoridade e passo a citar: "O problema está na palavra por ti utilizada: "Autoridade"." Foi esta frase que deu o mote para o meu post. Não quis pegar na questão de termos opiniões diferentes quanto à associação da palavra a JPP e por isso escrevi: "O facto de o Mukas (variações sobre o mesmo tema) não querer relacionar o termo com o JPP é tema para outra discussão, menos interessante a meu ver." É uma discussão de facto menos interessante e o Nuno provou isso mesmo no seu post.

quarta-feira, maio 14, 2003

O Mukankas diz que tem um problema com a palavra autoridade, sobretudo quando associada ao Pacheco Pereira. O facto de o Mukas (variações sobre o mesmo tema) não querer relacionar o termo com o JPP é tema para outra discussão, menos interessante a meu ver. Prefiro pegar na palavra autoridade e falar um bocadinho (o mais curto possível) sobre ela.

Auctoritas remete-nos para o verbo augeo, que significa fazer crescer, acrescentar, aumentar. O particípio de augeoautum – leva-nos a auctoritas ou, mais concretamente a auctor: “aquele que faz avançar, aquele que acrescenta, aquele que aumenta a confiança; fiador; abonador; professor; modelo; mestre; conselheiro; fonte; origem; causa.” A definição do dicionário esclarece-nos quanto à importância do autor: o autor é quem tem autoridade; é quem cria e acrescenta alguma coisa. Este conceito é extremamente interessante porque, de certa forma, recupera a ideia perdida da autoridade do autor (conceitos indissociáveis que o pós-modernismo insistiu em separar).

Seguindo a ideia de “aumento” no conceito de autoridade, a nossa síbila Maria Helena da Rocha Pereira, no segundo volume da obra Estudos de História da Cultura Clássica, diz que a auctoritas “é, portanto, algo que vem adicionar-se a uma situação já existente, e lhe confere mais peso”. E continua: “Esta noção permite-nos desde logo intuir que não se trata de uma norma com efeito vinculativo, de uma prerrogativa bem definida. É um valor intrínseco, que não se exerce pela persuasão e convicção, mas apenas e somente pelo peso da pessoa ou corporação que toma ou sanciona uma decisão.”

Julgo que é também por causa da ausência desse "carácter vinculativo" que temos tanta dificuldade em aceitar a autoridade. O reconhecimento de valor nos outros é uma prova de generosidade e desprovimento de mesquinhez. Nem todos estamos preparados para isso e nem todos fomos educados nesse sentido (para fora). O reconhecimento de autoridade tem inúmeras vantagens, sendo a que mais me interessa a competitividade. Mas o mono-diálogo já vai longo e prometi que seria breve. Prometo que o próximo post será sobre a Ana Salazar.

terça-feira, maio 13, 2003

Agradecimentos

Quero agradecer ao Cruzes Canhoto porque falou do bomba e de mais uma série de outros blogues que não foram mencionados naquele artigo medíocre do DN. O Cruzes demonstrou uma generosidade pouco habitual nestas coisas da escrita - muito bonito. Um grande beijinho para o J e para o N.

Quero também agradecer ao umblogsobrekleist pela referência que fez ao bomba. Aproveito para lhe pedir que me responda ao e-mail que lhe enviei.

Quero agradecer ao Modus Vivendi que elogia a minha assumptio. Nesse mesmo post de umas meras quinze linhas, a Ana Vivendi, que se diz "intimidada", cita Wittgenstein, Ovídio e Aulo Gélio. É caso para dizer: foda-se! Bem-vinda à blogosfera!

Quero ainda agradecer à minha Mãe e ao meu Pai e desejar paz para o mundo e que se descubra a cura para a pneumonia atípica! Snif...
Já que o Tudo Menos Política desvendou o meu QI (grrrrr...), queria só dizer que fiz o teste à boa maneira antiga com papel e caneta. 52 respostas certas = 127. Parece que o QI vai aumentando com a idade (o que faz todo o sentido se a vida correr mais ou menos bem), por isso decidi desde já fazer outro teste daqui a um ano. Deve chegar...
O bomba inteligente não podia deixar de fazer o teste de QI da TVI. Mas quem quiser saber o resultado, terá de escrever para bombainteligente@hotmail.com.

sábado, maio 10, 2003

Já que falo de blogues de que gosto e que leio com regularidade, queria destacar os da família Cavaco: Voz do Deserto casado com o Tudo Menos Política, irmão gémeo do Quezia, por sua vez casado com o Mukankala (embora neste último tenha lido que a blogosfera tinha demonstrado subserviência por ocasião do aparecimento do blogue do Pacheco Pereira. Hm... ao que o Mukankas chama subserviência, eu chamo respeito à autoridade de um homem com conhecida vida política, inteligência e coerência. O que salvou o Mukankala de um raspanete do género "estás a protestar de maneira errada", foi o seu sentido de distância nos posts que se seguiram. Pronto, fica para a próxima). Resta-nos o Fora da Lei, amigo pessoal da família. Por mim, gosto muito de todos. Ao Tudo Menos Política insisto para que não ceda às eventuais tentações de se demitir. Não se arranjam colegas de trabalho como essa em todo o lado. Essa mulher é uma mina! Digna da série "The Office".
Por indicação do meu querido amigo Nuno, tenho seguido diariamente os escritos do blogue a psicossomática. Só vos digo que quero as cabeças de quem deu duas estrelas a este blogue fantástico de humor corrosivo. E numa bandeja de prata!

Por falar em humor corrosivo, não posso deixar de mencionar o blogue escrito pela rapaziada da Periférica. Mais interessante do que partilhar gostos, é partilhar des-gostos e na Periférica percebo que temos tantos em comum que não posso deixar de mencionar alguns: Possidónio Cachapa, Eduardo "bicos-de-pés" Cintra Torres, Carlos Magno. Vou passar a comprar a Revista.
Segui com atenção um documentário sobre os crocodilos do Nilo no canal Odisseia. São bichos monstruosos, mas confesso que gosto da atitude: quietos, só com os olhitos de fora, à espera do que cai na água. Parece que podem estar até dois anos sem comer. Na verdade, são animais pré-históricos que assim sobreviveram à extinção. Enquanto víamos o programa, o meu marido e eu tivemos a brevíssima troca de palavras que passo a transcrever:

- Olha que medo se uma coisa destas nos aparecesse à frente.
- Pois é, querida, e com a vida que nós levamos...
Quem quiser oferecer-me todos os romances e ensaios filosóficos da Iris Murdoch, por favor escreva para bombainteligente@hotmail.com.

quinta-feira, maio 08, 2003

Esta polémica acerca da veracidade da autoria do Abrupto é muito engraçada. Percebi que, além de mim, apenas duas ou três pessoas acreditaram que as frases no blogue eram escritas por José Pacheco Pereira. Independentemente de ser uma pessoa crédula, percebo quem não acreditou no que se estava a passar. A reacção do "o quê, o Pacheco Pereira a juntar-se aos putos e a perder o seu precioso tempo a escrever num blogue, não pode ser" é bonita e fica bem. Só os vaidosões como eu é que acreditam ser natural partilharem o mesmo espaço com pessoas como ele (inteligentes, ocupadas...).

quarta-feira, maio 07, 2003

O José Pacheco Pereira chegou à blogosfera. Só espero que não me envie a sua versão do que é o fora de jogo. É que não aguento mais! Fale-me de coisas simples: da Moderna, da pedofilia, da Fátima Felgueiras. Mas entretanto seja muito bem-vindo!
E para rematar a discussão acerca do fora de jogo, nada melhor do que um e-mail esclarecedor do Cruzes Canhoto. Agora sim! Nunca mais farei perguntas tontas durante um jogo de futebol.

Cara Charlotte

Deixa-me acabar de vez com as tuas dúvidas. Todas as mensagens anteriores estão erradas. Quem está "fora-de-jogo" são os três mecos com cachecóis a assistir da bancada, os 15 000 tipos sentados no café com uma cervejola a ver a Sport TV, os 100 000 cromos que compram A Bola, o Record e O Jogo todos os dias, as velhinhas a tricotar enquanto esperam pela telenovela, os comentadores desportivos, os fanáticos que ligam para a Bancada Central da TSF... Todos os outros estão "dentro-de-jogo", inclusive os apanha-bolas e os suplentes, e o facto do árbitro apitar, fazer uns gestos bruscos e mandar parar um golo antes de ele entrar na baliza é apenas sinal que está a ser pago pela outra equipa para os ajudar a ganhar. É simples. J

terça-feira, maio 06, 2003

Powered by audblogaudblog audio post Esta é uma maneira diferente de dizer: "Olá! Sou a Charlotte."
A minha querida amiga Vera é bonita e talentosa. What more could one wish for? Ah, que fosse flautista, pois claro!

Quinta-feira, 8 de Maio, Igreja da Encarnação (Largo do Chiado) - 13h30

Vera Morais - Flauta e Edoardo Sbaffi - Violoncelo
Programa: A. Vivaldi, sonata IV em Lá M; J. S. Bach, sonata IV em Dó M; J. S. Bach, sonata V em Mi m; A. Vivaldi, sonata VI em Sol m.
Bem, se até o João Miranda me envia um e-mail a explicar o que é o fora de jogo...

Charlotte

Vou tentar melhorar a definição do fora de jogo: o fora de jogo existe quando, no momento do passe, o jogador que o irá receber se encontra no meio campo do adversário, à frente da linha da bola e adiantado em relação ao penúltimo defesa adversário. Não há fora de jogo quando o passe consiste num lançamento de linha lateral ou quando o passe é feito pelo adversário. Quando dois atacantes estão isolados em frente à baliza, se um deles passar a bola para o outro, é fora de jogo se a bola for passada para a frente mas não é fora de jogo se a bola for passada para trás.
Acorda uma menina de tez pálida pela manhã e é assaltada por mais dois (sim, dois!) magníficos e-mails acerca da bola. São ambos sobre o fora de jogo, o que só reforça a minha teoria de que ninguém sabe do que anda a falar.

Esta primeira mensagem é do André Fontes (obrigada, André pela clareza no discurso).

Cara Charlotte

Deparei-me hoje com a sua dúvida. Permita-me mais alguns esclarecimentos.(Nunca são demais quando se discute esta fascinante matéria.) O fora de jogo, como já aí foi referido, existe quando, no momento do passe, o jogador que o irá receber se encontra adiantado em relação ao penúltimo defesa adversário. O que não foi aí dito é que o fora de jogo nunca pode ser assinalado se o jogador que "recebe o passe" está atrás da linha de meio campo ou quando o passe consiste num "lançamento à mão" (ou lançamento de linha lateral) da bola. :)


A segunda mensagem, que elimina todas as dúvidas, é da autoria da minha querida Ana Albergaria. Enjoy!

Olá, querida Charlotte!

Pois que só agora me dei conta dessa dúvida - fundamental - respeitante ao futebol: o fora de jogo! Tenho andado distraída, e a pensar só no F.C.P. e, confesso, tenho descurado os blogs dos amigos. Essa temática é-me cara, que é. :)

Se quiseres, minha querida, podes dizer à vasta rapaziada que te lê, admira, idolatra etc; que aqui a rapariga Ana lhes explica - e de uma vez por todas - o que é o fora de jogo! ( Não há como uma palavrinha feminina e ajuizada e, vá lá, modesta... para aplacar as dúvidas sobre futebol! :) ) Portanto: isto basicamente tem duas hipóteses; é fora de jogo quando a bola ultrapassa - completamente - uma das linhas do rectângulo de jogo; ou então é fora de
jogo quando o homem do apito, vulgo árbitro, interrompe o jogo e assim o decide.

Sei dizer que, na hipótese dois, há, quiçá, um défice de democracia... que há!, mas é a vida e o que importa é ultrapassar isso, marcar golos e sagrar-se campeão como acontece com o grandioso F.C.Porto! E mais nada!

Ana-dragona-Albergaria :)

segunda-feira, maio 05, 2003

Agora foi a vez de o umbigoniilista me enviar a sua visão dos factos (uma expressão estranhamente paradoxal) acerca do fora de jogo. Isto é poesia, carago!

Ao longo dos tempos, muito se tem escrito / apitado sobre o 'fora de jogo', e não poucas vezes mal. Após décadas de um obscurantismo revoltoso, que podemos resumir no juridicamente genial "é fora de jogo sempre que o árbitro apita e marca fora de jogo, mesmo quando não o é" (duríssima lex, sad, sad lex), julgo ter descoberto o verdadeiro propósito do fenómeno: conferir ao futebol, desporto algo simplório por natureza, aquele je ne sais quoi de mistério, apanágio de actividades tão peculiares quanto a 'pelota basca', o 'cricket' ou, por que não, o 'futebol americano'.
O Tudo Menos Política também se quis meter nesta conversa dos futebóis e enviou-me um e-mail com certo ar cor-de-rosa e denunciador do género (feminino ou masculino, entenda-se) do autor do blogue. Aproveito aqui para lhe pedir que continue a deliciar-nos com os seus relatos sobre a colega de trabalho e que não se demita, por favor!

Cara Charlotte

Gostaria de poder ajudar-te com as questões de definição de fora de jogo mas os meus conhecimentos futebolísticos são do piorzinho que há. Se estiveres interessada em saber o que é um árbitro, um jogador ou uma bola, acho que ainda te posso ajudar.
O Espada Relativa também decidiu comentar a questão fundamental do fora de jogo, o que me fez pensar em dois outros problemas ainda relacionados com o futebol: o pré-jogo e o pós-jogo. O pré-jogo consiste na excitação que vive antes do jogo e que é devidamente transmitida pelos canais de televisão durante horas e horas - o abrir das portas do estádio, as claques nos autocarros, os incidentes antes do jogo, a chegada das claques, os incidentes no estádio etc. O pós-jogo consiste no comentário de personalidades históricas, como o Gabriel Alves, conhecidas por terem inventado um discurso em torno das estratégias da bola. Fazem parte do pós-jogo os festejos (material para inúmeros telejornais) de vencedores. Poooooooooooorto! Poooooooooooorto!

Deixo-vos o comentário do Espada Relativa, que considero delicioso. Gostei muito da ideia da teoria, da análise associada à regra. Este post só demonstra que, no futebol, não há consensos.

Fora de Jogo

A Bomba Inteligente anda preocupada com o Fora de Jogo. O Mukankala forneceu-lhe a definição da regra. Mas para que serve afinal o fora de jogo? A questão é simples: obrigando os jogadores adversários a estarem entre os ultimos defesas da sua equipa e a linha de baliza adversária obtemos aquilo a que se chama "pressionar o adversário", ou seja, quando uma "defesa sobe no terreno" quer dizer que a equipa adversária fica com menos espaço para colocar lá os seus jogadores, como se uma parede móvel fosse diminuindo o tamanho da sala. Sem o fora de jogo o futebol perdia metade da emoção e metade dos aborrecimentos. Já agora parabéns ao FC Porto por ter posto todos os outros fora de jogo, não sou adepto desse clube, mas sou adepto de que a justiça e o mérito devem existir no desporto, e sendo assim o FC Porto bem mereceu o titulo.
O Nuno Mukankala Soares escreveu-me por causa das minhas dúvidas futebolísticas. Obrigada, Nuno! Hoje até durmo melhor.

Olá Bomba

Aqui escreve o mukankala. Ao ler o teu mail, não pude deixar te escrever para responder às questões da bola. Assim, rapidamente cá vai disto:

Fora de Jogo - No momento em que um jogador da equipa atacante efectua um passe para outro jogador dessa equipa, têm de estar dois jogadores da equipa adversária, entre o jogador que recebe a bola e a baliza. Normalmente esses jogadores serão o guarda-redes e um defesa, mas podem ser quaisquer dois. Estará fora de jogo o jogador que recebe a bola e só tem entre a bola e a baliza o guarda-redes, ou um defesa, caso o guarda-redes tenha saído da baliza.

Rapar as pernas - Isto não vem nas leis da bola, mas está relacionado com o facto de eles fazerem bastantes feridas nas pernas e estando estas rapadas é mais fácil aplicar os tratamentos, bem como se evitam as infecções provocadas pelos pêlos.

domingo, maio 04, 2003

O meu querido Zé Diogo Quintela diz que os guarda-redes não correm e que por isso a minha descrição dos 22 marmanjos a correr atrás de uma bola está incorrecta. A verdade é que já vi guarda-redes a correr atrás da bola. E o que dizer do árbitro que corre atrás dos jogadores? E, afinal, rapam ou não as perninhas?
O meu marido, após o chatérrimo Benfica-Sporting, lançou a terrível suspeita: os jogadores de futebol agora rapam as pernas? Peço a quem tenha a resposta que a envie para bombainteligente@hotmail.com.

sábado, maio 03, 2003

As mulheres e o futebol

À primeira vista não haveria razão nenhuma para as mulheres não gostarem de futebol. Afinal de contas, trata-se de assistirmos a 22 rapazes bem constituídos a correr durante 90 minutos. Mas há uma razão ainda mais forte para as mulheres não gostarem de futebol: não conhecemos nenhum deles. E poupem-me a conversa do canalizador, do electricista ou do jardineiro porque essa é uma invenção masculina. Só os homens desejam o que não conhecem. Com as mulheres as coisas passam-se de outra maneira. (Note-se que estou a generalizar e muito provavelmente a enganar-me muito.)

Mesmo depois de ouvir a Germaine Greer e o George Steiner a analisarem o fenómeno do futebol e de assistir à defesa deste desporto pela pitonisa da Martha Nussbaum, a verdade é que não percebo o entusiasmo. Confesso que é um jogo que me aborrece, tal qual um mau filme que não vejo até ao fim. Depois de muito tempo a pensar nestas coisas ("só eu sei porque fico em casa!"), percebi que tem a ver com o ritmo. Para que consiga seguir um jogo de futebol até ao fim, este tem de ser rápido, porque os 90 minutos jogados lentamente significam o dobro ou mais; ou seja, tornam o jogo insuportável. Cheguei também à conclusão de que os jogos entre equipas portuguesas são lentos, algo que não ajuda nada ao meu caso. Admito que, por um motivo de rapidez de acção, gosto de ver um Machester United-Real Madrid (e se o Figo não jogar, ainda melhor) ou um Argentina-Brasil, este último não tanto apenas pela velocidade mas também pela emotividade.

E as regras? As regras confundem muito a minha pobre cabeça. Felizmente, não é só a minha. Ainda no outro dia falava sobre as minhas angústias futebolísticas com três homens (sendo um deles o meu marido, um portista ferrenho, o outro o nosso maradona, sportinguista doente e o terceiro, o umbigoniilista, um benfiquista moderado) e nenhum me soube explicar a regra misteriosa do fora de jogo. Todos tinham interpretações diferentes para a dita regra. Percebi que até no futebol há espaço para a teoria de o "leitor poder preencher os espaços em branco". Mas afinal não há certezas nenhumas a que nos possamos agarrar? Juntamente com o fora de jogo, o canto e o pontapé de baliza (quando é uma coisa e quando é outra) pertencem à minha lista de dúvidas de estimação.

O meu desprezo, no entanto, vai para os jogos amigáveis. Fico muito irritada quando me falam num jogo magnífico e amigável. Um jogo ganha-se, perde-se ou empata-se. Essa coisa do amigável anula as primeiras duas possibilidades; um jogo amigável, por sê-lo, é justo que termine sempre num empate, mesmo que aparentemente haja um vencedor e um perdedor. Tentaram explicar-me que se tratava de um ensaio em que se podiam conseguir receitas de publicidade e mais não sei o quê. E eu pergunto: e os apostadores apostam em que "amigo"? Vencer um jogo amigável não tem nenhuma glória e perdê-lo não é vergonha nenhuma.

No outro dia, cometi um erro de distracção total ao assistir a uns três minutos de um jogo aparentemente importante. "O quê? Já são 21h03?" perguntei, e o Nuno, com um risinho de gozo, respondeu: "21 minutos e 3 segundos de jogo. Girls and football... You gotta love 'em!"
Ontem ouvi uma notícia perturbadora. Um homem desapareceu em Águeda após se ter despedido da mulher com um "vou ali e já venho". Onde estará agora? Em Bragança ou em Chaves?
Vira uma pessoa as costas durante uns míseros dias para se concentrar no estudo profundo de A Ilíada (deve ser, deve), e pumba, tem logo uma quantidade de e-mails a pesarem na caixa do correio. Mas o que é essa história da "estória"? Qual é o problema da palavra homossexualidade? E como é que entusiasmo é uma palavra grega? E, finalmente, o que diabo está escrito no final da mensagem?

Bom, antes de mais, obrigada por todas as mensagens e perguntas que enviaram (desde já anuncio que não sou loura, como julga o DiFool). Prometo três parágrafos curtíssimos e explicativos da etimologia de cada um destes três vocábulos:

1. A palavra "estória" não está registada no dicionário da Academia das Ciências, facto que prova que é melhor do que se diz para aí. O dicionário de Cândido de Figueiredo tem a palavra registada como história em português antigo (whatever that means) e não lhe dá muita importância. Mas vamos lá ao que importa: história é composta de dois vocábulos - 'istos, que significa rede e roí, o verbo fluir em grego antigo - que juntos têm o bonito sentido de "uma rede que flui". À espécie de apóstrofo (') que vêem antes da palavra istos, chama-se espírito rude e trata-se do sinal de aspiração que transliterado para latim resultou num h. E o que é que estória tem a ver com isto? Nada.

2. A palavra homossexualidade significa "do mesmo sexo" porque 'omos não quer dizer homem (como tenho ouvido por aí), mas o mesmo.

3. Finalmente, o vocábulo entusiasmo é de origem grega (julgo até que a primeira vez que aparece é em Platão), porque compreende a preposição en, que significa dentro e theos, deus. Ou seja, o entusiasmo é termos deus em nós, o que me parece uma ideia superior.

No final do post anterior está escrito: "obrigada e beijos para todos".

Prometo que só falarei destas coisas uma vez por mês. No máximo, duas.

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